A lama de rejeitos da extração de minério da Samarco (Vale + BHP Billiton) que devastou o rio Doce está prestes a chegar no mar. Confira o que diz um dos maiores especialistas da vida marinha do ES, o pesquisador da Estação de Biologia Marinha de Santa Cruz, André Ruschi, que alerta para a dimensão dos estragos e propõe ações para minimizá-los. André é filho e herdeiro intelectual do patrono nacional da ecologia, o cientista capixaba Augusto Ruschi.
Qual a dimensão do desastre para a vida Marinha?
Pode atingir 10 mil km² ou mais. Todo o banco de Abrolhos que começa em Aracruz e termina no sul da Bahia, todo o litoral norte do ES até 200 km afastados da costa e uma parte da Cordilheira Vitória-Trindade que vai até 1.200km da costa, tudo isso vai receber uma carga de metais pesados. É um problema muito maior do que no rio Doce. 1/3 do oceano Atlântico, depende do que acontece no litoral do estado do ES que é a Amazônia marinha do planeta e um dos lugares mais desconhecidos da Terra. No litoral do ES se pesca alimento para 20 milhões de pessoas, parte importante do pescado brasileiro estará comprometido.
É possível estimar por quanto tempo haverá problema?
Logo quando começar a chegar essa carga tóxica, vai sim ter um primeiro impacto e depois virão, outros e outros e outros durante décadas. A cada grande chuva vem uma nova carga, um novo impacto que vai se acumulando, então um impacto contínuo de longa duração, de mais de 300 anos. É mais tempo ainda do que o rio Doce, porque o ecossistema marinho como corais, algas calcárias crescem de uma maneira muito lenta. Se uma árvore grande leva 500 anos para crescer, uma alga calcária grande leva 3 mil anos para crescer.
Você falou também que seria possível segurar a lama nas barragens das hidrelétricas. Por que acha que não fizeram?
Ignorância e por baseamento em técnicas e em ciências antigas e ultrapassadas. Ainda existe uma resma em algumas classes profissionais de considerar o mar como um lugar para jogar rejeitos, lixos, esgotos e coisas do gênero. A parte viva do mar representa 5% do oceano, e é só a orla do Continente. A parte mais viva dessa orla é exatamente o estuário dos rios.
O que deve ser feito para recuperar os ecossistemas atingidos? Tem uma estimativa de quanto deve custar isso?
São R$ 200 bilhões para rio Doce e R$ 300 bilhões para mar. Tem que tirar essa lama toda que está aí. Mataram a quinta maior bacia hidrográfica do país, uma das 100 maiores do mundo e que está associada a um dos três mais importantes ecossistemas marinhos da Terra.