Na noite da última quarta-feira (21), o Jornal Tempo Novo celebrou seus 40º aniversário e lançou o livro “Serra: a história de uma cidade”, de autoria deste colunista que vos escreve. Um dos momentos mais marcantes do evento foi quando o ex-prefeito Audifax Barcelos (PP) e o atual prefeito Sergio Vidigal (PDT) subiram juntos ao palco para discursar em nome dos prefeitos que passaram pela Serra.
Esse gesto surpreendeu os presentes, sendo imediatamente seguido de aplausos do público presente, estimado em 600 pessoas. Audifax e Vidigal concordaram em diversos pontos durante suas declarações, destacando o enorme desafio de governar a Serra e a necessidade intrínseca de ter muita responsabilidade administrativa em um contexto em que a Serra continua sendo uma das cidades de maior crescimento populacional do Brasil — fenômeno iniciado em 1960 e detalhado no livro lançado.
Houve trocas de cumprimentos e referências respeitosas, em um ambiente onde também os apoiadores de cada um mantiveram um nível de respeitabilidade mútua. Para esclarecimento, ambos os prefeitos foram consultados por este colunista sobre a possibilidade de fazerem uma declaração conjunta em nome dos oito prefeitos que passaram pela Serra durante a cobertura jornalística do Tempo Novo ao longos das últimas 4 décadas.
Eles são: Naly Miranda, Aldary Nunes e Eryx Guimarães, que já faleceram, e José Maria Miguel Feu Rosa, que foi vítima de assassinato em 1990. João Batista da Motta e Adalto Martinelli não puderam comparecer, somando-se a Audifax e Vidigal, que já tinham confirmado presença. Ambos concordaram em falar juntos em nome desses oito prefeitos e não viram problema em dividir o palco.
Portanto, embora tenha surpreendido muitos, o gesto já estava previamente planejado no roteiro do evento. O que realmente chamou a atenção foi o entrosamento entre eles, algo que não é totalmente surpreendente, considerando o longo conhecimento que um tem do outro. Vale lembrar: Audifax foi secretário de Vidigal em seu primeiro mandato, em 1997. No segundo mandato, iniciado em 2001, ganhou ainda mais projeção e alinhamento com Vidigal, sendo escolhido para a sucessão na eleição de 2004, o que resultou em um governo compartilhado até meados de 2007, quando sinais de um rompimento se tornaram mais evidentes. Portanto, são figuras com uma rica história de relacionamento.
Mas, após a surpresa inicial, qual o real significado dessa atitude? Em um primeiro momento, é possível avaliar que antigos inimigos políticos pessoais deram um passo para tornarem-se apenas adversários políticos, algo absolutamente normal nos princípios que regem um sistema democrático. Nesse sistema, pessoas que pensam diferente ou possuem projetos eleitorais conflitantes podem frequentar os mesmos ambientes, dialogar e, eventualmente, até concordar em temas e assuntos diversos.
Este é um ponto importante e que parece estar pacificado. Muito diferente do que o colunista de A Gazeta lamentavelmente opinou, afirmando que haveria um “certo e notório” clima de constrangimento, tanto Vidigal quanto Audifax discordaram e avaliaram muito positivamente o gesto. Na manhã dessa sexta-feira (23), a coluna entrou em contato com eles, que confirmaram o que ficou evidente para aqueles que estiveram presentes no evento: um ambiente plural e democrático.
Para Vidigal, tratou-se de um “evento democrático de grande significância” cultural para a Serra. “As lideranças se respeitaram; foi um evento bonito em que a Serra foi a verdadeira protagonista, ganhando um livro sobre sua história e comemorando as atividades de um jornal histórico. Eu conhecia previamente o roteiro do evento e parabenizo todos aqueles que participaram. Talvez minha participação com Audifax seja um exemplo para a política nacional”, disse Vidigal, referindo-se ao alto grau de polarização em que a política nacional se encontra do qual o diálogo pró-Brasil, na maioria das vezes, parece ficar em segundo plano.
Audifax seguiu a mesma linha: “Fiquei muito feliz de ter participado de um momento histórico da cidade e entendo que a maturidade da classe política leva a gestos pluralistas, grandes e respeitosos à democracia, afinal, todos queremos o melhor para a cidade”, pontuou o ex-prefeito.
O gesto dado mutuamente por Audifax e Vidigal, com prévio consentimento de ambos, e que aponta uma transformação de inimigos políticos em meros adversários é, de fato, louvável e digno de destaque, especialmente considerando que são eles os dois prefeitos mais duradouros na história da Serra desde a instituição da Lei das Prefeituras. Com essa lei, o cargo de prefeito passou a ser eleito, e a Câmara, a legislar exclusivamente como ocorre hoje. Isso quer dizer que desde 1914, quando Cícero Calmon de Aguiar, o primeiro prefeito eleito pelos serranos, assumiu o mandato, Audifax e Vidigal são os mais longevos na história do município, marcado por um processo ruidoso que envolveu parceria, rupturas e inimizades pessoais.
Mas, na prática, isso muda algo eleitoralmente? Em princípio, absolutamente nada. Audifax continua como pré-candidato a prefeito pelo PP, sem parar de caminhar, conversar e realizar reuniões nessa reta final de filiações partidárias. Vidigal, embora não tenha confirmado sua pré-candidatura à reeleição, segue fortalecendo o PDT e apoiando partidos aliados, sendo considerado pelo meio político como um forte candidato.
No evento, não estavam presentes apenas Audifax e Vidigal, que a princípio têm planos eleitorais distintos, mas também os deputados Pablo Muribeca (Republicanos), Vandinho Leite (PSDB), Alexandre Xambinho (Podemos), Igor Elson (PL), o vice-prefeito Tiago Carreiro (União Brasil), vários filiados do PT, como a vereadora Elcimara Loureiro e o ex-deputado Roberto Carlos, que tem recebido o apoio das correntes internas do partido para ser pré-candidato a prefeito, além de vereadores da base e da oposição.
Além disso, o segmento político era apenas um entre vários outros que prestigiaram o evento, incluindo membros do Poder Judiciário, representados pelo desembargador Pedro Valls Feu Rosa, entidades como Sermus, Fams, OAB, ASES, representantes da Polícia Militar, Findes e CNI, representados pelo empresário Léo de Castro, entre outros. No entanto, a maioria era composta por pessoas ligadas ao ativismo cultural, que não só tiveram seu espaço para declarações, como também formaram a maior parte da plateia. No fim das contas, assim como reportado ontem pela jornalista Ana Paula Bonelli, o evento foi uma celebração da democracia, cultura e história da Serra.
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