O ano de 2021 fecha com uma informação que há muito já vinha sendo ventilada: a economia da Serra superou Vitória e é a maior entre as 78 cidades capixabas. ‘Mais hora ou menos hora’ isso iria ocorrer, já que a curva de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) da Serra vem em crescimento acelerado ano após ano, enquanto Vitória desde 2010 apresentava um patamar de estagnação com pouca variação para mais ou para menos.
A Serra está no lugar que merece em vista de sua importância histórica para o Espírito Santo, seja recebendo os impactos sociais e ambientais advindo deste modelo de desenvolvimento econômico brasileiro, que traz consigo problemas subsequentes a ele, ou mesmo servindo como trampolim para o crescimento da capital. Vide, por exemplo, o Civit – Centro Industrial de Vitória – que originalmente foi pensado para absorver indústrias com forte impacto de vizinhança que não cabiam na capital.
Os dados foram divulgados pelo Instituto Jones dos Santos Neves e se refere ao ano de 2019. O PIB do Espírito Santo foi de R$ 137,3 bilhões, destes, a Serra significou 18,86%, ou seja, R$ 25,87 bilhões. Vitória pela primeira vez desde a séria histórica deixou a liderança e foi para a vice, com 15,7%, seguida por Vila Velha, 9,4% e Cariacica, 7,4%.
Na prática, o PIB em crescimento oferece mais chances de desenvolvimento econômico e social. Para um PIB crescer, um dos fatores que mais influencia é o consumo das famílias. Por isso, é um indicador tão importante.
A Serra é uma potência com envergadura de economia nacional. No Brasil, está ocupando a posição 39º dentre mais de 5 mil cidades. Com exceção do ano de 2008 para 2009, a Serra só registrou crescimento do seu PIB. Saiu de R$ 4,5 bilhões em 2002 para os atuais R$ 25,87 bilhões em 2019, um crescimento de 474% em menos de 20 anos.
Dentre as fontes que compõe o valor do PIB, o setor mais expressivo é o de serviços que significou praticamente metade do montante total: R$ 12,05 bilhões. Impostos também entram na contabilidade do PIB e, em 2019, foi de R$ 5,83 bilhões. A indústria – que foi a responsável histórica pelo impulsionamento econômico da Serra – representou R$ 5,67 bilhões do PIB.
Embora a Serra não apareça na lista de municipalidades cuja atividade principal é a indústria, lidera o ranking das maiores participações no setor com 18,6%. Segundo o IJSN, essa liderança foi influenciada, sobretudo, pela perda de participação de Vitória.
Junto com Presidente Kennedy (2º), Marataízes (3º) e Itapemirim (4º), destacados pela atividade extração de petróleo e gás natural, os 4 municípios somaram pouco mais da metade do VA (valor adicionado) gerado pela indústria no Espírito Santo (52,6%). O que demostra uma concentração deste setor na economia estadual.
De acordo com IJSN o que pesou na perda de posição de Vitória (que ficou em 7ª) foi o impacto na atividade de pelotização de minério de ferro, reflexo do rompimento da barragem de rejeitos de minério da Vale em Brumadinho-MG.
No setor de serviços, a Serra também tem a maior fatia do PIB capixaba, pela primeira vez, na série desde 2002, a posição ocupada pela capital Vitória (17,7%) foi alterada com a Serra (17,9%), que assumiu o posto de participação mais significativa nos serviços, estimulada, sobretudo, pelas atividades de logística e saúde mercantil.
Entre os piores desempenhos da Serra na composição do PIB está o setor de agropecuária, que engloba as atividades agrícolas, pecuária, silvicultura e extrativa vegetal, pesca e aquicultura. A Serra não aparece nem nas 10 primeiras cidades e significou apenas 0,5% do setor no PIB do ES.
Dois mundos opostos
Enquanto economicamente a Serra avança fortemente, parte expressiva da população continua com dificuldade muitas vezes de ter o mínimo. Esse público é mais vulnerável a política econômica nacional e com as crises que tem se aprofundado, como aumento da inflação e desvalorização do real, a diminuição do poder de compra tem tolhido a renda das famílias mais pobres.
Estima-se, segundo dados do CadÚnico, que cerca de 120 mil moradores da Serra vivem na linha da pobreza. Índice que pode ter sido potencializado pela pandemia.
O que esse público quer de imediato é acesso à saúde, alimentação e ser integrado ao mercado de trabalho formal. Nesse sentido, a Serra tem uma demanda muito grande, do qual é difícil de ser suprida em escala industrial. Diferente de Vitória, que tem uma riqueza per capita consideravelmente maior e menos demanda social. Salvo em comparações pontuais, em geral, a qualidade de vida na capital é maior muito em vista do amplo público de classe média que reside na capital, pressionando menos o Município por serviços públicos.
Há alguns anos, a Serra vem avançando nesse frente, até porque, enquanto fenômeno urbano, a cidade é bem mais jovem do que a capital. Mas os dados são animadores, haja vista, por exemplo, os números de homicídios. Este ano de 2021 marca um período de queda histórica nos registos de assassinatos. Na prática, nunca se matou menos do que hoje em dia; foram 128 homicídios enquanto em 2002 matou-se 434 pessoas, uma média superior a um assassinato por dia, por exemplo.
Houve avanços também em áreas fundamentais, como saneamento básico. A Serra é uma das cidades com o melhor índice de residências ligadas a rede de esgoto do Brasil (90%) e está no top 60 do Brasil. O objetivo para os próximos anos é investimento no setor de tratamento.
A Serra vem rompendo barreiras, e tem uma população orgulhosa de morar aqui, mesmo diante dos problemas. Foi essa cidade que acolheu pessoas de muitos lugares no Brasil; e hoje essas pessoas fizeram família de novos serranos: a geração nascida e crescida aqui está fervilhando querendo oportunidade, segurança, educação, saneamento, saúde, emprego, vida noturna, espaços de lazer, ou seja, qualidade de vida. Esse é o desafio da Serra do século XXI, transformar tanta riqueza e pujança econômica em qualidade de vida para seu povo e transformação social.