Bruno Lyra
A greve dos caminhoneiros revela um movimento sem liderança muito clara. A força da mobilização pelas redes sociais dificulta a cooptação, mesmo considerando que este movimento possa estar sendo insuflado por empresários do transporte e instituições corporativas, como acusa o governo.
Se há algo inequívoco é a fragilidade da reação deste governo. E não obstante os esforços de estados e municípios para tentar evitar a paralisia total, o fato é que a reação das lideranças políticas está aquém do desafio e só confirma o porquê da insatisfação geral da população com o presente/futuro do país. População esta que mesmo sofrendo cada vez mais os efeitos, segue apoiando ou simpática a greve.
A insatisfação popular se estende para outros poderes, como o legislativo e o judiciário. Mas por hora parece catalisada contra o governo Temer, colocando gente de esquerda, centro e direita, incluindo grupos pró-retorno da ditadura militar, numa agenda comum que é muito mais do que a redução do preço do diesel. O Brasil é um barril de pólvora que às vezes explode.
E desta vez atinge até os protagonistas caminhoneiros e seus familiares. Afinal, são pessoas que também estão com risco de ficar sem alimento, não ter remédio e atendimento hospitalar, água, transporte e outros itens de primeira necessidade. Muitas são as lições que essa greve pode ensinar. Uma delas é problema da dependência do petróleo e da matriz rodoviária.
O Brasil errou feio em dar às costas aos trens e hidrovias. Errou ao negligenciar o álcool, onde tinha virado vanguarda. Erra ao permitir que estradas sejam péssimas. Erra ao fazer concessões duvidosas, com pedágios caros em relação ao que se entrega. Erra ao arrancar o couro da população com impostos e burocracia asfixiantes, sobretudo com os mais pobres. Erra ao não promover maior igualdade social e a continuar privilegiando castas.
É possível o desabastecimento se estender pelos próximos dias. É possível que o brasileiro médio tenha que passar um período de racionamento. Mais ou menos como as classes mais carentes já vivem no cotidiano. Isto a cerca de cinco meses de uma eleição presidencial e nos estados. Será um grande teste para a república e ainda que o assombro da saída autoritária se insinue como rumo, há de se aprender mais um pouco da lição de uma democracia cada vez mais horizontal, de protagonismo virtual que a cada lance desce a terra das pessoas de carne e osso.