A Grande Vitória enfrenta um problema antigo que se intensificou: os gargalos portuários. As limitações do Porto de Vitória são bem conhecidas e foram, em parte, minimizadas após sua privatização e transferência para a administração da concessionária Vports. No entanto, os entraves logísticos ainda são enormes, especialmente considerando o potencial do Espírito Santo como porta de entrada e saída para o Brasil. Essa situação piorou com o aumento vertiginoso da importação de carros elétricos que impactou diversos outros segmentos.
Recentemente, uma carta assinada por duas poderosas entidades: o Centro do Comércio de Café de Vitória (CCCV) e o Centrorochas (Centro Brasileiro dos Exportadores de Rochas Ornamentais) causou forte repercussão. A carta destacou problemas como filas de navios, escassez de contêineres, dificuldade no controle dos gates, ineficiência nos sistemas de atendimento ao consumidor dos terminais portuários, e falta de espaço para movimentação de carga, entre outros pontos que aumentam os custos e diminuem a competitividade.
Essas reclamações afetam diretamente a Serra, onde o setor de Rochas Ornamentais é estratégico. Dados de 2023 do relatório de exportações de rochas do Sindirochas confirmam essa importância. O Espírito Santo lidera com folga, sendo responsável por 82,24% do valor total exportado no país. Desse montante, a Serra é a líder, responsável por 30% do total do Espírito Santo, o que equivale a 1,33 bilhão de reais. Embora a extração das rochas não ocorra na Serra, é no município que parte expressiva do beneficiamento é realizada e de onde as rochas saem para serem exportadas.
É evidente que o Porto de Vitória não apenas pode, mas deve sofrer melhorias, considerando os anos de sucateamento impostos pelo poder público durante a administração da Codesa, o que resultou em um descompasso nas suas estruturas frente as oportunidades para o estado. Contudo, mesmo com esses investimentos (se acontecerem), a capacidade do porto de atender à vocação capixaba para o comércio exterior é limitada, devido aos entraves geográficos que impedem sua expansão. A baía de Vitória continuará sendo um obstáculo para o trânsito de navios de grande porte, independentemente dos investimentos realizados.
Existem outros projetos em andamento no Espírito Santo, especialmente em Aracruz. Ainda assim, o estado está se destacando no Brasil e no mundo como porta de entrada e saída. O ES é um estado organizado, com estabilidade jurídica, administrativa e política, diferentemente do Rio de Janeiro, por exemplo. Além disso, está estrategicamente posicionado. Esses fatores serão ainda mais relevantes após a implantação da Reforma Tributária, que acabará com a guerra de benefícios fiscais e, em tese, horizontalizará a competitividade. Há espaço para debater a criação de outro porto na Grande Vitória, dado o futuro promissor que está se desenhando.
Nesse contexto, a Serra pode reconsiderar o antigo projeto do porto na região sul da cidade. Trata-se de um projeto apresentado há dez anos no Plano de Desenvolvimento do Município da Serra, que já previa um déficit portuário na Grande Vitória e propôs a criação de um porto offshore na região de Praia de Carapebus, com uma retroárea de 130 mil m², adaptável às demandas atuais e futuras. Na época, o investimento previsto era de R$ 300 milhões, valor que hoje está desatualizado.
O terminal portuário estaria próximo ao Porto de Tubarão, cujas operações atendem à ArcelorMittal. Devido a essa proximidade, foi proposto também que o Terminal de Produtos Siderúrgicos (TPS) operado pela Arcelor fosse adaptado para um porto de contêineres e cargas, atualmente o maior gargalo do Espírito Santo. Este serviço só existe no limitado Porto de Vitória, que abriga o único terminal de contêineres do estado, o Terminal de Vila Velha. Portanto, não se trata de soluções “fora da caixinha”; há projetos de pelo menos 10 anos que visam diminuir as tensões portuárias na Grande Vitória, recolocando a Serra na rota do desenvolvimento portuário capixaba.
É um projeto que poderia, inclusive, ter sinergia com a terceira estrada ligando a Serra a Vitória, que passará exatamente por essa região e pretende interligar o litoral sul da Serra com a zona norte de Vitória. Este novo viário é um projeto estratégico e está avançando burocraticamente, sendo realizado com recursos oriundos da primeira operação internacional de crédito da história da Prefeitura da Serra. É um projeto que mais hora, ou menos hora, vai sair do papel, pois a necessidade de interligar Serra e Vitória por um terceiro viário é mais do que necessária.
Agora, no que diz respeito a este assunto do Porto da Serra, precisa ser tratado com estratégia pelo poder municipal, dada sua complexidade. No entanto, há uma oportunidade, considerando a real demanda por uma solução como essa. Politicamente, trata-se de uma articulação nacional, mas precisa ser discutida primeiramente no âmbito local, uma vez que o cenário há 10 anos era diferente. Grandes projetos saem do papel dessa forma; um exemplo é o Contorno do Mestre Álvaro, que começou a ser debatido há 30 anos e precisou de diversas colaborações para ser concretizado.