Yuri Scardini
A Estação Conhecimento, projeto ligado a Vale, presta um notável serviço para a Serra. Por ano, são cerca de 1.900 jovens beneficiados com vários projetos sociais, com enorme poder transformador e capaz de trazer perspectivas frente à situação de vulnerabilidade social da qual estão inclusos. Isso é indiscutível.
Porém, é legitima a discussão sobre a contrapartida da Vale, a mantenedora da instituição e “mãe” do projeto. A empresa é responsável por indeléveis impactos diversos e históricos na Serra, sendo toda a formação econômico-social da cidade, intrinsecamente ligada ao processo de instalação, ampliação e funcionamento da Vale.
Logo, a Vale é indissociável da mutação social da cidade, degringolada para um processo de favelização e consequente explosão de bolsões de pobreza, que coincidem com o mapa da infindável violência, que já atingiu patamares dignos de cenários de guerra.
Portanto, há de se questionar sim, até que ponto é justo, um convênio no montante de R$ 1,2 milhão da Prefeitura da Serra, com a Estação Conhecimento. Já que a Vale é a mantenedora e vende este projeto como o maior símbolo de uma suposta responsabilidade social. A empresa não poderia arcar com isso sozinha? Dá para ir além, a Vale não poderia investir ainda mais e ampliar o projeto? É claro que dá. Só no 3º trimestre de 2017, segundo o portal do G1, a empresa registrou um lucro líquido de R$ 7.14 bilhões. A Vale é a maior mineradora do mundo.
O que a empresa deixa no município é migalha frente as suas responsabilidades históricas morais. Só para se ter uma ideia, o único imposto direto que o município arrecada, proveniente da Vale, é o IPTU referente a oficina de locomotiva, no valor de pouco mais de R$ 100 mil, e só.
Seria irresponsável defender menos recursos para a Estação do Conhecimento, é o inverso disso. Há de se defender mais investimentos e ampliação, mas por parte da Vale. Ela pode não ter a obrigação legal de fazer isso, mas o mundo é mais complexo do que questões jurídicas. Mantendo parte da Estação Conhecimento, a empresa poluidora não faz nenhum favor ao município.
Para se ter ideia, a Serra tem 100 mil pessoas na linha da pobreza, que tem renda de R$ 150 pra baixo, por mês. É o equivalente a uma Colatina ou Viana, só de pobres. É uma realidade assustadora para quem a conhece.
Portanto, vida longa à Estação do Conhecimento, e que Vale assuma cada vez mais suas verdadeiras responsabilidades com a Serra e com o Estado que sofre estruturalmente com a lama no rio Doce na sua economia, pó preto, praia de ferro, descarga de resíduos nas praias, entre outras “contribuições” da empresa.
Que multiplique projetos como este de Cidade Continental, tocado pela coordenadora-executiva Ana Angélica Motta e uma equipe dedicada. Mas com o dinheiro da Vale, sem precisar de prefeituras arrochadas e convênios que dão margem às dúvidas, como o discurso de responsabilidade social da empresa.