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“Há metais pesados na água do rio Doce que podem causar câncer”

O governador Paulo Hartung disse que a tragédia deve esquentar o debate sobre as regras de mineração do país, enquanto o prefeito de Baixo Guandu,Neto Barros, teme efeitos a longo prazo da suposta contaminação por metais pesados no rio Doce. Foto: Divulgação

Por Conceição Nascimento 

O governador Paulo Hartung (PMDB) e o prefeito de Baixo Guandu, Neto Barros (PC do B), apesar da diferença de tamanho das estruturas que governam, tem uma coisa em comum: o desafio de liderar comunidades afetadas pelo desastre da Samarco /Vale/ BHP Billiton no rio Doce. Confira nas entrevistas como os dois políticos estão reagindo.  

O Espírito Santo não deveria participar do licenciamento / fiscalização da mineração na bacia do rio Doce em Minas Gerais? 

É lei. Em Minas quem licencia é Minas, no Espírito Santo quem licencia é o ES. É um desastre de graves proporções, mas somos um Estado federado e cada Estado tem sua autonomia, submetido à Lei maior. Quem autoriza a mineração no país é o DNPM (Departamento Nacional de Produção Mineral), com base no código mineral do nosso país, que é antigo e que agora está sendo atualizado no Congresso Nacional. Esse debate vai esquentar muito a partir dessa tragédia.

O estado tem contribuição importante nesse arranjo produtivo, mas sofre também os impactos negativos da mineração…

Aqui no ES não temos minério de ferro. O papel que o Espírito Santo e o Rio de Janeiro têm é o de logística. Temos ferrovias e portos e o papel de escoar a produção de minério de ferro para o Brasil e principalmente para o mundo. Todo o processo de licenciamento da acumulação dos resíduos, quem fiscaliza e dá licença ambiental é o Governo de Minas e o Governo Federal. É assim a Lei Brasileira.

O senhor defende mudança na legislação?

Um acidente como esse, especialistas estão falando que pode ser duas coisas: ou as normas federais não foram cumpridas rigorosamente ou são insuficientes e terão que ser mudadas a partir desta tragédia, que está sendo considerado o maior desastre ambiental na história do país. Se estas normas tiverem que mudar, serão ouvidos o Governo federal e o Congresso.

O que o Governo do ES vem fazendo para amenizar os efeitos da catástrofe?

Trabalhamos em Baixo Guandu para montar rapidamente uma captação no rio Guandu. Em Colatina fizemos a mobilização de carros pipa e pedimos ajuda ao Exército para fazer a distribuição de água e a nossa polícia continua com seu trabalho.  Linhares não capta água no rio Doce, mas tem o impacto na vida marinha, por isso estamos correndo junto com Ifes, Ibama, para recolher um pouco da fauna do rio e colocando em reservatórios, para que passada essa onda de lama, façamos o repovoamento do rio, que será desafiador e difícil. O desastre impacta os pescadores e vai afetar a vida marinha, em Regência, Povoação.

E quais devem ser as medidas a médio e longo prazo para a recuperação da bacia?  

Vai chegar uma hora que vamos defender com muita força um trabalho estrutural para recuperação do rio. A empresa (Samarco) é responsável pelo dano e tem que cuidar que causou. É possível, tem mananciais em outros países que passaram por um dano muito grave e com um trabalho de recuperação, deu resultado. Já entreguei à presidente Dilma um plano de recuperação de toda bacia.

Neto Barros

Foi confirmada a presença de metais pesados na água do Rio Doce?

Sim. Arsênio, manganês, alumínio, chumbo, bário, entre outros. Esses metais pesados na água do rio Doce não dão para separar no tratamento e podem causar câncer. Vai afetar a irrigação, plantações, pastagens. Contaminar a carne e o leite do gado.

Será feita a avaliação periódica do rio Doce?

Sim, precisamos saber o que está chegando para nós desse dejeto. Nossa captação está sendo feita no Rio Guandu. A captação no Doce foi cancelada horas antes da chegada da lama em Aimorés, há três dias.

O que foi feito emergencialmente para pegar água no Guandu?

Foi concluída a obra paliativa de limpeza do canal, que estava assoreado há mais 40 anos; a antiga barragem que gerava energia, a hidrelétrica Lutzow. Agora vamos fazer a obra definitiva, o que vai custar em torno de R$ 2 milhões.

A prefeitura estima o quanto gastou por causa do desastre?

Não tivemos tempo de fazer esse cálculo. Mas estamos registrando cada centavo de combustível, hora/máquina, material, mão de obra e outras despesas que estamos assumindo. A Samarco anuncia que está fazendo alguma coisa, mas é conversa fiada. Quem está organizando a distribuição de água são as prefeituras e os governos.

O que acha das respostas até agora dadas pelos governos federal e estadual?

Do Governo do ES está satisfatória. Já o Governo federal está sendo muito protocolar. Falta uma atitude mais enérgica para se cobrar responsabilidades, tanto de quem licenciou quanto da empresa.  Desde que soubemos do desastre, pedi um tratamento mais rigoroso, como indisponibilidade dos bens da empresa e prisão dos responsáveis. Fizemos um TAC com o Ministério Público e a empresa para que se responsabilize pelo ressarcimento e pela recuperação ambiental.

Baixo Guandu pretende parar a ferrovia novamente, caso não tenha respostas satisfatórias?

A Prefeitura não. Nossa medida foi de extrema indignação para alertar o mundo sobre o que estava acontecendo aqui. Mas as comunidades atingidas e até outros organismos da sociedade civil organizada já manifestaram interesse de paralisar, se for necessário.

Acha que teria sido viável represar a lama?

Poderia ter havido o desvio do rio, que estava com a calha muito seca, mas nada se pensou porque não tinha plano de contingência.

O ES deveria participar do licenciamento e fiscalização da mineração no vale do rio Doce em MG?

Sim, pois ficamos à mercê dessa irresponsabilidade aqui embaixo. São quase 400 represas nas cabeceiras do rio Doce.

 

 

 

Gabriel Almeida

Jornalista do Tempo Novo há mais de oito anos, Gabriel Almeida escreve para diversas editorias do jornal. Além disso, assina duas importantes colunas: o Serra Empregos, destinado a divulgação de oportunidades; e o Pronto, Flagrei, que mostra o cotidiano da Serra através das lentes do morador.

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