A abertura artificial da barra da lagoa de Carapebus é um crime ambiental recorrente nos últimos anos no litoral da Serra. E voltou a ocorrer em maio, entre os dias 12 e 13. Um vídeo feito por morador flagrou pessoas cavando areia da praia e criar um canal para escoar as águas da lagoa para mar.
O morador que gravou as imagens pediu para não ter o nome divulgado por temer represálias. Veja o vídeo do momento em que foi iniciada a escavação, é possível ver até crianças participando.
Segundo ele a abertura começou no dia 12 e foi concluída no dia seguinte. Não se sabe o motivo que levou as pessoas a abrirem a lagoa desta vez, mas segundo o morador a prática clandestina é feita geralmente com dois objetivos. Um é para facilitar a captura de peixes, uma vez que o dreno faz grande parte da água da lagoa escoar para o mar.
Quando isso ocorre surgem imensos bancos de areia e a lagoa vira um fio d’água cercado por alguma poças, deixando milhares de peixes presos e fáceis de pegar. A lagoa só volta a encher quando as próprias forças naturais voltam a fechar o canal com areia, o que pode durar dias.
A outra razão da abertura artificial, prossegue o morador, tem a ver com a ocupação urbana desordenada da região. É que nos últimos anos terrenos próximos às margens da lagoa foram ocupados irregularmente por residências. Em épocas de muita chuva o nível da lagoa sobe e atinge esses casas. Então para fazer baixar o nível da água é escavada a barra da lagoa.
Veja outro vídeo do momento em que a abertura se expande com a força das águas, gerando até risco de afogamento para banhistas e pescadores.
Vale lembrar que além da legislação federal de proteção aos mananciais e faixas costeiras a lagoa de Carapebus faz parte da Área de Proteção Ambiental (APA) Estadual de Praia Mole, portanto deveria estar sendo protegida.
Diretor da APA, o biólogo Edson Valpassos, explica o porque da abertura artificial da barra prejudicar a lagoa. “Aquilo que as pessoas estão fazendo ao abrir a barra da lagoa é o que a natureza vai fazer mais cedo ou mais tarde. Entretanto é evidente que não se deve interferir no ritmo da natureza. Deveria se esperar que a lagoa abrisse naturalmente e não forçar a abertura da barra. Até porque esse processo é sincronizado com a ecologia dos animais”, observa.
Edson lembra que os peixes são os mais afetados. “Os peixes vão amadurecer seu processo de desenvolvimento de forma que alguns vão migrar para dentro da lagoa e outros em direção ao mar. E quando a gente antecipa isso, a gente está permitindo que justamente haja algum tipo de impacto como é percebido no esvaziamento da lagoa. Aumenta a quantidade de peixes de água doce que vão na correnteza para o mar e morrem por causa da salinidade. E com a água da lagoa baixa também tem mortalidade de peixes porque a superfície diminui, consequentemente a troca gasosa também. Por isso diminui o oxigênio. Em resumo, é algo que não deve ser feito”, alerta.
Município diz que vai apertar fiscalização
A Secretaria Municipal de Meio Ambiente da Serra (Semma) informou na tarde de ontem (01), através de nota, que não recebeu denúncia sobre a abertura da lagoa entre os últimos dias 12 e 13 de maio. Mas disse que enviaria uma equipe ainda ontem para apurar o caso.
A Semma também afirmou que irá intensificar as rondas na região para tentar coibir a prática.
Histórico de degradação
Abertura indevida da barra, pesca predatória e ocupação desordenada são só alguns dos problemas da lagoa Carapebus. O manancial também sofre com a poluição pelo lançamento de esgoto doméstico e em janeiro deste ano registrou mortandade em massa de peixes.
Outro impacto existente – e ainda pouco mensurado – é o da precipitação de pó preto sobre o espelho d’água e o carreamento deste material pela chuva que cai no entorno. Isto porque a região de Carapebus é vizinha ao Complexo Industrial de Tubarão (Vale e ArcelorMittal), principal responsável pela emissão de pó preto e outros poluentes siderúrgicos no ar da Grande Vitória.
Sobre este tema, um estudo inédito desenvolvido pela Universidade de São Carlos (SP) em parceria com a UFES e instituições de pesquisa da Argentina, França, Reino Unido e Austrália, está avaliando o impacto do pó preto no meio aquático. Além de entender como afeta peixes e outros organismos aquáticos, o estudo também quer mensurar o dano do pó preto à saúde humana considerando que as partículas de poeira ficam menor ao contato com a umidade, podendo ser mais absorvidas pelo organismo.
Uma das pesquisadoras que está à frente do estudo é a bióloga serrana Iara de Souza, que passou boa parte de sua vida morando em Portal de Jacaraípe.
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