O Tribunal de Justiça do ES (TJES) manteve a multa de R$ 6 milhões aplicada pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente (Semma) à Vale por conta do lançamento de óleo da oficina de locomotivas na lagoa Pau Brasil durante a superchuva ocorrida em 30 de outubro de 2014.
A informação foi divulgada nesta segunda-feira (18) pelo procurador do município, Gilberto Santana. Segundo ele, a decisão foi proferida no último dia 28 de junho e contou com o voto unânime dos três desembargadores que avaliaram o processo. De acordo com Gilberto o valor da multa corrigido pode chegar a R$ 16 milhões. E como a Vale ainda pode recorrer em 3ª instância junto ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), não foi estabelecido prazo para a quitação do débito.
“A decisão do Tribunal foi uma vitória para a população serrana. Fiz a defesa do município durante todo o processo e pude ver como a Vale dá as costas para a Serra. No processo, ela alegou que a lagoa não ficava no município. Consegui provar o contrário, já que a Pau Brasil é cercada pelos bairros Hélio Ferraz, Manuel Plaza e é formada pelo córrego Carapina”, relatou o procurador.
E não é só. De acordo com Gilberto, também no processo, a Vale chegou a dizer que a lagoa não pode mais ser considerada essencial para o equilíbrio ecológico do município, uma vez que está poluída.
“Achei um desrespeito. Até porque contraria a Constituição e uma decisão do STJ que diz que ninguém tem o direito de poluir. Esse argumento da Vale é como se alguém dissesse que não tem problema atropelar uma pessoa paraplégica porque ela já não anda mesmo”, comparou.
A reportagem procurou a Vale que disse que está realizando a dragagem da Lagoa Pau Brasil na área da Unidade Tubarão. O projeto prevê a dragagem, limpeza e desassoreamento dessa parte da lagoa. O trabalho teve início em junho e deve ser concluído em cerca de cinco meses.
Água oleosa e com esgoto na casa de moradores e na praia de Camburi
A lagoa Pau Brasil é formada por nascentes que existem no vale entre Manuel Plaza e Hélio Ferraz. E recebe água de chuva e esgoto jogado indevidamente na drenagem pluvial de parte de Carapina. Dela segue o córrego que forma outras lagoas na área da Vale no Complexo de Tubarão. Depois essas águas descem na altura da entrada do Parque Botânico da mineradora, já em Vitória, indo cair na parte norte da Praia de Camburi. Balneário poluído e interditado para banho neste ponto.
Segundo Gilberto, existem comportas na área da Vale que regulam a vazão dessas águas. O procurador acrescentou que, no processo do TJES, a empresa não entregou os documentos atentando manutenção dessas comportas.
E, posteriormente, admitiu que as comportas estavam fechadas no dia que houve o vazamento dos tanques de resíduos oleosos decorrentes da lavagem e manutenção das locomotivas. O que contribuiu para o transbordamento da lagoa Pau Brasil e invasão das casas na comunidade ribeirinha de Hélio Ferraz, na Serra.
“Porque essas comportas estavam fechadas? Será que a Vale não queria que a população da área nobre de Vitória visse o óleo caindo no cartão postal da capital? A população da Serra existe e precisa ser respeitada”, criticou o procurador
Tanques perto da Pau Brasil e força jurídica da mineradora
Gilberto destacou ainda o fato dos tanques de resíduos da oficina de locomotivas ficarem perto da lagoa. “São dois tanques, um de 700 m3 (700 mil litros) e outro de 400 m3 (400 mil litros). É estranho a Vale não se preparar, não ter informações sobre chuvas fortes. Esses tanques ficam num local que já se provou ser de risco. A empresa disse que trata esses resíduos. O óleo é direcionado para São Paulo. O efluente que sobra, que a Vale já admitiu que antes jogava na lagoa, diz que atualmente recircula esse líquido, usando – o novamente para lavar as locomotivas”, conta.
Por fim o procurador disse que enfrentar a Vale nos tribunais não é tarefa fácil, mesmo para um município grande e industrializado como a Serra. “É uma empresa que tem recurso para contratar os escritórios de advocacia de renome. Nós não temos essa estrutura. Além disso dois dos desembargadores que estavam no processo simplesmente se disseram impedidos para julgá-lo e eu não sei o porque”, relata.
Protesto e dragagem
Segundo os moradores ribeirinhos de Hélio Ferraz não foi só na superchuva de 30 de outubro que o óleo da Vale caiu na lagoa e invadiu as casas com a enchente. Isso também aconteceu em outras ocasiões, fazendo com que a comunidade fizesse protestos contra a empresa. A Vale, por sua vez, já chegou a comprar eletrodomésticos para os moradores que os perderam para a água da enchente suja de óleo.
A convite da comunidade de Hélio Ferraz, a reportagem esteve no último dia 08 de junho nas margens da Pau Brasil. Ocasião em que pode perceber que, apesar da poluição, o local ainda possui animais silvestres como macacos, gambás, pássaros, peixes, cobras e até jacarés, além de vegetação ciliar.
Na mesma ocasião os moradores relataram promessa da Vale em fazer dragagem da lagoa, que estava tomada por vegetação aquática em função do excesso de poluição. E, segundo o líder comunitário do Conjunto Carapina I, Leandro Ferraço, a dragagem já está sendo feita pela empresa. Inclusive há um vídeo que demonstra a execução do serviço. Veja:
Justiça manda Vale pagar multa milionária por lançar óleo em lagoa da Serra em 2014: pic.twitter.com/K2QnYCPyic
— Jornal Tempo Novo – Serra/ES (@portaltemponovo) July 20, 2022
A empresa
Até o momento da publicação dessa reportagem a Vale ainda não havia se manifestado sobre a decisão do TJES em manter a multa aplicada pela Prefeitura da Serra em 2014. Caso a empresa se posicione, essa matéria será atualizada.