LEONARDO VIECELI
Mães solo enfrentam mais dificuldades de inserção no mercado de trabalho e, quando conseguem uma ocupação, têm uma renda média inferior a de grupos como mulheres e homens casados e com filhos.
É o que sinaliza um estudo assinado pela economista Janaína Feijó, pesquisadora do FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas).
De acordo com o levantamento, o rendimento do trabalho das mães solo no Brasil foi estimado em R$ 2.105 por mês no quarto trimestre de 2022. O valor ficou quase 39% abaixo da renda dos homens casados e com filhos (R$ 3.438).
Antes da pandemia, no quarto trimestre de 2019, essa diferença era menor. Elas recebiam 33,4% a menos do que eles -R$ 2.325 e R$ 3.493, respectivamente. Os dados foram publicados em termos reais, ou seja, com o ajuste pela inflação.
“Ao contrário das mães solo, a trajetória dos homens no mercado de trabalho não é afetada após o nascimento dos filhos”, diz Feijó.
No quarto trimestre de 2022, a renda das mães solo (R$ 2.105) foi cerca de 20% menor do que o rendimento das mulheres casadas e com filhos (R$ 2.626).
“As mulheres casadas também enfrentam dificuldades no mercado de trabalho. A diferença é que elas podem contar com uma pessoa a mais com renda”, afirma Feijó.
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O estudo da economista foi elaborado a partir microdados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) Contínua, do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
A análise é focada nas mães solo de 15 a 60 anos que são consideradas pessoas de referência nos seus lares. As comparações são feitas com pais e mães da mesma faixa etária que estão em relações conjugais.
O estudo aponta diferenças dentro do próprio grupo das mães solo. No quarto trimestre de 2022, a renda média do trabalho das mães solo negras foi estimada em R$ 1.685 no Brasil. O valor ficou 39,2% abaixo do rendimento das mães solo autodeclaradas brancas ou amarelas (R$ 2.772).
Feijó afirma que um dos motivos para essa disparidade é o nível de escolaridade. No quarto trimestre de 2022, em torno de 21% do total de mães solo brancas ou amarelas tinham ensino superior. Entre as mães solo pretas ou pardas, o percentual caía a 9%.
De acordo com Feijó, há uma forte correlação entre o momento da maternidade e o grau de escolaridade das mulheres. Nesse sentido, quando a gestação acontece durante a fase escolar (entre os 14 e 25 anos), pode dificultar e até mesmo inviabilizar a continuidade dos estudos, com possíveis reflexos sobre o futuro profissional das mães, aponta a pesquisa.
Segundo o levantamento, entre as mães solo que tiveram o primeiro filho com 15 anos ou menos, apenas 3% contavam com ensino superior completo. Já entre as que tiveram o primeiro filho aos 30 anos, 22% apresentavam ensino superior completo.
“As mães negras tendem a ter filhos mais cedo, e isso retroalimenta a situação desfavorável no mercado de trabalho. Consequentemente, vai repercutir no nível salarial”, diz Feijó.
As mães solo que tiveram o primeiro filho mais tarde, por volta dos 27 anos, tendem a apresentar um rendimento médio em torno de R$ 1.700, diz o levantamento. É mais do que o dobro da renda de quem virou mãe com 15 anos ou menos (R$ 800).
No quarto trimestre de 2022, 29,4% das mães solo estavam fora da força de trabalho no Brasil. Considerando somente as mães solo com filhos menores, de até cinco anos, a proporção era maior, de 32,4%.
Entre as mães solo negras, o percentual fora da força era de 31% para aquelas com filhos de diferentes idades e de 34,6% para aquelas com filhos de até cinco anos. Entre as brancas e amarelas, a proporção estava em 26,6% e 27,5%, respectivamente.
A população fora da força é composta por profissionais que não estão empregadas nem procurando ocupação.
Segundo Feijó, um dos reflexos das dificuldades de inserção no mercado de trabalho é a ida de mães solo para a informalidade.
De um lado, essa escolha pode permitir maior flexibilidade para que as mulheres consigam conciliar trabalho e cuidado dos filhos, diz a pesquisadora.
O efeito colateral é a renda menor que a informalidade costuma gerar na comparação com vagas com carteira assinada ou CNPJ.
“O que acontece é que a maternidade impõe um custo alto para a mãe. Para conciliar maternidade e trabalho, ela muitas vezes vai para uma ocupação informal”, analisa a pesquisadora.
O estudo ainda chama atenção para a evolução dos domicílios cujas pessoas de referência são mães solo no Brasil. O número aumentou de 9,6 milhões no quarto trimestre de 2012 para 11,3 milhões no quarto trimestre de 2022.
Isso significa um incremento de 17,8% na década, o equivalente a 1,7 milhão a mais de mães solo no período. Segundo o estudo, 90% desse aumento (1,5 milhão) veio de mães solo pretas e pardas, que passaram de 5,4 milhões para 6,9 milhões entre 2012 e 2022.
A maior parte das mães solo (72,4%) vivem em domicílios monoparentais, compostos apenas por elas e seus filhos. Ou seja, não moram com parentes e não contam com uma rede de apoio para ajudar nas responsabilidades familiares e laborais.
Na visão de Feijó, a melhoria das condições para a inserção dessas mulheres no mercado de trabalho passa por uma junção de esforços. Um deles viria da adequação da oferta e dos horários de creches às necessidades das trabalhadoras.
“Para a mãe com filho pequeno, a creche é fundamental. Muitas vezes, a creche não está perto da mãe, e os horários não ajudam. É preciso entender quais são as demandas das mulheres”, afirma.
Ela também defende medidas de capacitação para as mães solo que tiveram de interromper os estudos. Por fim, diz Feijó, empresas deveriam flexibilizar horários de chegada e saída do trabalho para que mães solo pudessem conciliar seus compromissos.
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