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“Mudar da Grande Vitória é solução para quem sofre com poluição do ar”

Ana Maria Casati estuda os danos para saúde e garante que o ar da Grande Vitória é muito pior do que o de São Paulo. Foto: Bruno Lyra

Por Bruno Lyra

Ana Maria Casati é médica pneumologista, pesquisadora da Ufes e consultora da CPI do Pó Preto da Assembleia Legislativa, que investiga os danos patrimoniais e à saúde dos capixabas da poluição emitida por Vale e ArcelorMittal. Nesta entrevista ela alerta que a poluição da Grande Vitória é muito mais nociva do que afirmam empresas e governos. 

Em depoimento à CPI a senhora aconselhou que pacientes alérgicos e com problemas respiratórios graves se mudassem da Grande Vitória. Por quê?  

Atendo muitos pacientes críticos, portadores de Doença Pulmonar Crônica Obstrutiva (DPOC), muito grave. A capacidade pulmonar deles é inferior a 30%. Eles estão no limite respirando um ar muito poluído, por isto estão sempre em crise, com tosse e hipersecreção. Alguns que se mudaram diminuíram as crises, as intercorrências respiratórias. Uma crise representa aumento da lesão e perda de capacidade. Pacientes com problemas respiratórios graves devem se mudar da Grande Vitória.

Quais são os grupos que mais sofrem?

Crianças menores de dois anos, idosos e os pacientes portadores de DPOC, que é o complexo bronquite – enfisema resultado do ato de fumar; pacientes portadores de asma, sinusite crônica, rinite. É difícil de controlar essa população porque eles estão expostos no dia a dia.  Você pode escolher fumar, mas não escolhe o ar que respira.

Dos poluentes emitidos por Vale e ArcelorMittal, quais os mais nocivos?

É a partícula fina, preta do minério que penetra no alvéolo, que polui o macrocircuito do sistema respiratório. O pesquisador Paulo Saldiva, referência no Brasil, possui pesquisa que mostra a correlação das poeiras finas, como o PM2,5, com o aumento de infarto, internação e acidente vascular cerebral (AVC). Tem trabalho científico que aponta que o PM 2,5  altera as membranas das células.  E há teorias que falam de alterações no tecido do coração, cérebro e maior incidência de Alzheimer. Paulo (Saldiva) sugeriu que se estude a composição química da poeira fina da Vale e Arcelor.

Que tipo de problemas os gases emitidos na siderurgia podem contribuir para agravar esse quadro?

Os gases SO2 (dióxido de enxofre), NO2 (dióxido de nitrogênio), CO (gás carbônico) além dos gases cancerígenos que não são medidos, como o benzopireno. Não sabemos a quantidade de gases cancerígenos eliminados na siderurgia de Tubarão.  O SO2 e o NO2 acidificam os rios, matam os peixes.

Essa poluição pode afetar o humor das pessoas no dia a dia?  

Essas alterações são secundárias. A poeira deixa o olho irritado, coça, gera tosse e provoca agudizações do paciente. São situações que alteram o humor e a parte psicológica dos afetados.

Também na CPI a senhora disse que o ar da cidade de São Paulo é menos nocivo que o da Grande Vitória…

Na prática clínica – e é bom lembrar que isto não é uma pesquisa científica – percebi que pacientes meus que trocaram Vitória por São Paulo têm menos crises lá do que aqui. O ar daqui é mais poluído.

A Organização Mundial de Saúde tem regras mais rígidas que as do Brasil para poluição do ar. Nossas leis deveriam mudar?

Urgentemente. Nossos parâmetros estão desatualizados. A indústria só segue o que manda a legislação. Já sugeri isso na CPI. Também acho importante que sejam espalhados painéis eletrônicos para informar em tempo real a qualidade do ar à população.  Informar, por exemplo, que tem momentos em que o ar não é adequado para corrida ao ar livre.

A orla de Camburi é um dos pontos prediletos de esportistas. É arriscado para a saúde se exercitar ali?

Se fizer atividade em Camburi ou na Praia do Canto, já dá para perceber a diferença. Não recomendo exercício na orla de Camburi quando tiver o vento nordeste. Quando eu era estudante de medicina, Augusto Ruschi alertou que não deveriam colocar as siderúrgicas em Tubarão.  Ele estava certo.

Vale e Arcelor Mittal deveriam indenizar a saúde pública?

Não temos pesquisas locais suficientes. Mas considerando as correlações apontadas em pesquisas, incluindo estudo norte americano mostrando impactos de siderúrgicas num vale, então é justo.

A senhora espera que essa CPI tenha algum efeito prático?

Acho que essa CPI deveria ser dos problemas respiratórios e cardiovasculares. Possivelmente muitas mortes por esses problemas são em decorrência da poluição de Tubarão. A gente não quer que eles parem de fabricar o aço. O que pedimos é a redução da poluição. Sabemos que Vale e Arcelor não têm os melhores filtros e controles. A CPI tem que conseguir aumentar os meios de controle. Mudar legislação, fazer com que as indústrias reduzam, principalmente partículas menores que o PM10, e avisar à população em tempo real sobre a qualidade do ar.

O que a população pode fazer para amenizar o pó preto e gases em suas casas?  

Fechar tudo e colocar ar refrigerado, trocar filtro, para limpar o ar. Para pacientes alérgicos, travesseiro de espuma inteiriça, capa anti-ácaro e colchão anti-ácaro. Sempre limpar o chão com pano úmido, mas sem varrer porque levanta poeira.  Quem possui problemas pulmonares tem que evitar ambientes fechados. Quanto se está com gripe, lavar sempre o nariz. Os pacientes DPOC têm de tomar antiviral Tamiflu. O mesmo vale para quem tem asma e sinusite.

Gabriel Almeida

Jornalista do Tempo Novo há mais de oito anos, Gabriel Almeida escreve para diversas editorias do jornal. Além disso, assina duas importantes colunas: o Serra Empregos, destinado a divulgação de oportunidades; e o Pronto, Flagrei, que mostra o cotidiano da Serra através das lentes do morador.

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