Na semana do Dia das Crianças, a juíza titular há 10 anos da 1ª Vara da Infância e Juventude da Serra, Gladys Henriques Pinheiro, apresenta um panorama da situação das violência sofrida por crianças e adolescentes, bem como as adoções. A juiza é a responsável pelo projeto Adoção Tardia, cujo objetivo é estimular as pessoas a adotar crianças mais velhas e adolescentes.
Em quais situações o Juizado atua?
Em casos de crianças e adolescentes em situação de risco social, negligência, abandono e abuso; Processos de Guarda; Processos de Destituição do Poder Familiar; Fazenda Pública de menores (medicação, internação, tratamentos, vaga em escola, entre outros).
A Serra também lidera nos casos de abandono, agressão e abusos sexuais às crianças?
Sim. O número é grande, mas não temos como fornecê-lo.
Quais regiões da Serra que tem maior índice de violência contra a criança?
Grande Jacaraípe, Feu Rosa, Vila Nova de Colares, Jardim Tropical e Central Carapina.
Quantas crianças existem nos abrigos da Serra?
São 90 crianças e adolescentes distribuídos em 12 abrigos. Eles vão parar lá por conta de maus tratos e abandono. Nem todas estão disponíveis para adoção, pois algumas ainda estão em processo de destituição familiar. A maior dificuldade é a adoção das crianças maiores de seis anos e adolescentes. Por isso fizemos o projeto Adoção Tardia, já que a maioria das pessoas prefere crianças de 0 a 3 anos.
Quais são os procedimentos para adoção?
Primeiro é procurar o Juizado. Chegando aqui, o interessado irá preencher o requerimento para fazer se habilitar. Uma equipe técnica vai fazer um laudo social, psicológico e essa pessoa fará curso de preparação para adoção. Se aprovada em todas essas etapas, vai receber a habilitação e vai entrar no Siga, sistema criado pelo Tribunal de Justiça que contém as instituições onde estão as crianças e os adolescentes, além da lista dos interessados em adotar. É uma fila que não pode ser furada. Só os juízes e a corregedoria do Tribunal têm acesso a este sistema.
É mais difícil adotar crianças menores de três anos?
As pessoas que procuram este perfil de criança têm uma dificuldade maior porque a maioria dos pretendentes ainda quer adotar crianças de zero a três anos. O tempo médio de espera é de três anos.
Por que há menos gente interessada em adotar crianças mais velhas e adolescentes?
Em estudos que eu fiz, percebi que existe um mito com relação a adotar crianças maiores. As pessoas pensam que essas crianças já vêm com a personalidade formada. Mas estudos comprovam que isso não existe, por isso criei o Adoção Tardia, para desmistificar a questão deste perfil pretendido e mostrar que é até mais fácil adotar crianças com mais de seis anos.
A senhora considera que essa preferência de idade é fruto de preconceito?
Sim. Mas os brasileiros já estão adotando as crianças maiores, grupos de irmãos e até mesmo crianças especiais.
Algum caso específico que a senhora queira mencionar?
Na Vara em que atuo, um casal adotou uma moça de 19 anos estava acolhida no abrigo há muito tempo. Também conseguimos a adoção de um grupo de quatro irmãos por uma mesma família. Esse preconceito tem diminuído muito, as pessoas estão se conscientizando.
Qual a diferença de adotar um bebê e uma criança maior?
Não existe diferença. Adotar um bebê é a mesma coisa que adotar uma criança maior. A gente tem o entendimento de que uma criança adotada pode ter os mesmos problemas de um filho biológico.
Quem pode adotar?
Solteiros, viúvos, casais hetero e também homossexuais. É preciso ser maior de 18 anos. Outra exigência é que o adotante deva ser pelo menos 16 anos mais velho que o adotado. Qualquer pessoa pode adotar, desde que seja avaliada pela equipe do juizado.
Já houve adoção para casais homoafetivos na Serra?
Sim. Já concedi duas adoções, uma para casal de mulheres e outro de homens. É necessária apenas a comprovação de união estável.
Há exigência de renda mínima para os adotantes?
Não olhamos valores econômicos. Temos famílias humildes que já adotaram. É claro que não vamos colocar uma criança numa família que não tem nenhuma condição. Não quer dizer que só quem tem renda alta pode adotar. A pessoa tem que conseguir cuidar da criança, proporcionar os cuidados necessários. O que vemos é o carinho, afeto, amor, e toda condição do sócio familiar e o psicológico.
Ainda existe uma maior preferência por adoção de crianças brancas?
Ainda existe isso. Têm pessoas que procuram crianças brancas de olhos claros. Mas isso tem diminuído bastante e nosso projeto visa isso também, desmistificar essa coisa toda.
Há casos de devoluções?
Sim. Alegam que a criança tem um problema comportamental, que elas não obedecem. Os casos de devolução são mais frequentes nas adoções de crianças com mais de seis anos. Mas são poucos, não é comum. Mesmo porque hoje em dia os interessados passam por um curso de adoção. A criança até três anos tem uma facilidade muito grande de adaptação e nunca houve devolução.
Os pretendentes visitam os abrigos para escolher as crianças?
Não. Os lares de bebezinhos normalmente eu não autorizo visita. O serviço social chama a pessoa na época para conhecer aquela determinada criança que está disponível para adoção. Daí se a pessoa não quiser adotar, chamo o próximo pretendente da fila e assim vai.
A estrutura do Juizado é suficiente para atender a demanda?
Não, mas as demandas necessárias já estão sendo providenciadas, inclusive a estrutura física e local para funcionamento do Juizado.
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