Por Conceição Nascimento
O prefeito de Baixo Guandu, Neto Barros (PC do B), tem ganhado destaque na mídia com seu posicionamento após a tragédia da Samarco (Vale + BHP Billiton) em Mariana. Ele, que comanda a 1ª cidade capixaba a receber os resíduos da lama de minério que desce o rio Doce (as outras são Colatina e Linhares), fechou a ferrovia Vitória Minas na noite desta quinta (12) exigindo que a Vale ajude no fornecimento de água à população. Horas antes, Barros divulgou análise da água coletada pela SAAE do município em Governador Valadares, indicando que a lama está trazendo metais pesados. Na tarde desta sexta (13) o prefeito decretou estado de calamidade pública na cidade. Nesta entrevista ele fala desses posicionamentos e da angústia da população no vale do rio Doce.
Como foi essa história de interromper a ferrovia Vitória Minas?
Interrompemos ontem (12), às 18 horas, e curiosamente às 23h30 recebemos uma ordem judicial para desobstruir a ferrovia sob pena de multa diária de R$ 50 mil. A Justiça está bem ágil para proteger os poderosos. Ficou interditada até 23h30.
Por que o senhor resolver bancar essa interrupção?
Queria mostrar a indignação de toda a cidade, o que já é compartilhado na região, à medida que a lama vai chegando. Mostrar nosso repúdio, já que as autoridades estão muito lenientes e permissivas em relação às mineradoras. Está comprovado que o interesse financeiro está acima das pessoas. A Justiça trabalha para garantir o lucro das empresas em detrimento do meio ambiente. Só se fala em multas que não são pagas. Este acidente não é o primeiro, nem será o último. A mineração é muito nociva ao meio ambiente, é a mais poluidora das atividades. A presidente fala em multa de R$ 250 milhões, a gente para a ferrovia, mas a mineradora consegue liminar rapidamente para garantir o fluxo do minério e o lucro. Essa é a Justiça do Brasil. O crime já tem nove dias, sem nenhuma punição. Se pegar casos como o de Muriaé, Cataguases, vai acontecer da mesma forma. As empresas não tem plano de contenção nem prevenção de desastres. Os licenciamentos são frágeis.
Como está o município de Baixo Guandu neste momento?
Baixo Guandu está se precavendo para garantir o abastecimento domiciliar, para o comércio e trabalhando uma captação no Rio Guandu. Vamos excluir a captação no Rio Doce, que está morrendo. E decretar estado de calamidade pública.
Como será feita esta captação no Guandu?
Vamos reformar a antiga barragem do Rio Guandu, que tinha uma usina hidrelétrica desativada há mais de 40 anos, a Lutzow, que foi desativada assim que inauguram a usina de Mascarenhas. Esse rio desagua no Rio Doce. Estamos trabalhando lá com cerca de 70 homens, para garantir o paliativo. Depois apresentaremos o projeto para a Samarco e à Secretaria de Estado de Saneamento, Habitação e Desenvolvimento Urbano (Sedurb) para cobrar deles o ressarcimento do investimento, a obra deve beirar os R$ 2 milhões.
Esses 70 homens são funcionários da prefeitura ou da Samarco?
É contratação nossa, por meio do SAAE (Serviço Autônomo de Água e Esgoto), autarquia do município. A Prefeitura está bancando todos os custos e quem cometeu o crime está ainda impune.
Como está a população?
O pânico se instalou aqui, assim que a notícia foi divulgada. O abastecimento e a captação no rio Doce serão interrompidos, assim que conseguirmos fazer a captação alternativa e, quando percebermos que a água está contaminada. Por enquanto, nas análises não demonstram isso na captação, apenas rio acima. Estamos trabalhando dia e noite para concluir a obra do paliativo para captação no Rio Guandu. A previsão da chegada da lama tóxica é entre hoje (13) à noite e amanhã. Então vamos cessar a captação da água e entregar em domicílio.
Além dessas há outras medidas?
Primeiramente estamos fazendo o plano de contingência para minimizar os efeitos, ou seja, garantir a água para as pessoas e para manter a normalidade da cidade. Também estamos tentando no trabalho de garantir a captação e tentando levantar recursos para fazer a obra definitiva. Não vamos ter mais captação no Rio Doce, pois ele está morrendo e quando a lama passar aqui a lama tóxica ele vai morrer.
E a contaminação da água?
Os metais presentes na água, como alumínio, ferro, arsênio, tem todos os elementos da tabela periódica. Bastante tóxicos e não são tratáveis nem absorvidos pelo organismo humano. É uma intoxicação generalizada e vai envenenar toda a região de agora para a frente, não sabemos até quando. O dano ambiental é seríssimo.
O que avaliou da visita da presidente Dilma Rousseff?
Foi uma visita muito protocolar, não tivemos oportunidade de manifestar nossa preocupação, pois foi muito rápido. Estamos contabilizando os custos e vislumbramos a possibilidade de acionar a Samarco também por danos morais.