O simples cumprimento de uma promessa política. É isso que há por trás da nomeação do jornalista Philipe Lemos na Secretaria de Turismo, Cultura, Esporte & Lazer, concretizada oficialmente ontem (terça-feira, 28). No início dessa semana alguns segmentos, em especial a galera de Vitória, se arvoraram com informação de que o ex-jornalista da Rede Gazeta iria ser secretário na Serra, fato que já vinha sendo dado como certo há algum tempo nos bastidores políticos e que foi objeto de operação abafa por algumas semanas aqui na Serra.
Desde que a coisa emergiu dos bastidores, o óbvio aconteceu: especular Philipe Lemos como candidato a sucessor do prefeito Sergio Vidigal. Ocorre que tal possibilidade é tratada como piada no núcleo mais íntimo do prefeito. Absolutamente nada indica que Vidigal não será candidato à reeleição em 2024, ninguém acredita nisso no meio político da Serra e todo mundo que age politicamente, o faz dentro dessa perspectiva.
Philipe Lemos chega por alguns motivos, mas não é como sucessor do prefeito. Vidigal usa o jornalista como cortina de fumaça para embolar o jogo eleitoral. Enquanto isso, perto de completar 66 anos, Vidigal está em forma, com vigor em dia, e se preparando para mais uma eleição. Não passa pela cabeça da militância vidigalista, dos seus aliados mais fiéis e da sua cozinha política, nada que não seja esse o plano: eleger Sergio Vidigal prefeito.
Então, Philipe cumpriu o primeiro objetivo, embolou o campo eleitoral. Outro item: o compromisso. O jornalista estava em vias de ser candidato em outro partido na eleição de 2022. Nos últimos momentos do fechamento dos prazos eleitorais, o governador Renato Casagrande tirou ele do ninho tucano e colocou-o no PDT para atender Vidigal. O objetivo era usar Philipe para atingir o coeficiente eleitoral e levar Sueli Vidigal novamente à Brasília. Sueli e Philipe foram bem, mas o restante da chapa uma negação. Acabou que todo mundo ficou de fora.
Mas Philipe Lemos não se deixou ser usado a troco de nada. Precisava de garantias de que em caso de derrota seria absorvido ou por Casagrande ou pelo prefeito. Promessa feita, promessa cumprida, nesse caso por Vidigal. O salário de secretário municipal da Serra, no olhar da maioria esmagadora da população serrana (e brasileira) pode parecer alto: pouquinho mais de R$ 12 mil. Mas para a realidade de outros, muitas vezes não compensa. E na do jornalista, não compensa sair da Enseada do Suá, onde reside, para vir cá em Serra Sede; e no final do mês com os descontos e o custo de translado e permanência, tirar talvez metade do vencimento bruto. Espera-se que Philipe Lemos receba boas remunerações em jetons.
Não tem nada de ilegal nisso; jetons são dispositivos de remuneração para servidores que participam de conselhos ou outros órgãos, sendo remunerados por isso. Existem em todos os níveis de poder. Só não costuma ser bem visto pelo público em geral. Fala-se, bem preliminarmente, que o jornalista tenha chegado a um combinado na ordem de pouco acima de R$ 20 mil, entre salário de secretário e jetons. Mas, só será possível saber se essa informação de bastidor procede com o transcorrer dos acontecimentos. Para todos os efeitos burocráticos, Philipe Lemos está há dois dias no cargo.
Então, como cortina de fumaça, o jornalista serviu a Vidigal; e como garantia de sustento, Vidigal serviu a Philipe. Mas tem mais. Philipe Lemos empresta sua jovialidade e pode dar um ar gourmet para a gestão do prefeito Sergio Vidigal. Um famosinho capixaba de TV e de web vai ser muito útil nas ordens de serviço; e a Serra adora isso (e como adora); e conhecedor da população da Serra como poucos, Vidigal deve usar isso a seu favor. Quem sabe até, Lemos não seja um vice a ser considerado lá pra frente, a depender do seu desempenho? Muito mais plausível do que a fragilíssima tese de sucessor. Vidigal deve espremer o jovem jornalista até a última gota e no fim ser candidato a prefeito com a imagem renovada de um ‘patriarca descolado’.
Quando o papo desce para a vida das comunidades, parece muito difícil que a tônica dessa eleição não seja Vidigal e Audifax… claro, que vai depender da atitude on e off do governador, que até então está com Vidigal… do sentimento de ‘chega de Vidigal&Audifax’ que é crescente e não pode ser desprezado… além da nacionalização da eleição com essa coisa de bolsonarismo, anti-bolsonarismo, petismo e o anti-petismo; além das demais forças que se colocam com pautas locais. Os únicos que já o fizeram isso publicamente foram o deputado Pablo Muribeca e o vereador Igor Elson… mas, tem mais (bem mais).
Quem pensa em esgotamento de Audifax e Vidigal, deveria conhecer a clássica rixa da família Miguel e da família Castelo, que mantiveram uma rivalidade extremada que permeou a política da Serra por 50 anos, muito mais agressiva e aprofundada, que começou lá no início do século XX e foi começar a perder força com a subida de Naly Mirada para a Prefeitura nos anos 50. No final, as famílias acabaram se entrelaçando por laços matrimoniais, e hoje em dia é tudo parente.
Nascido em João Pessoa em 1983, erradicado capixaba bem jovem e com carreira sólida e reconhecida como jornalista e apresentador de TV em solo espírito-santense, Philipe Lemos é sim um bom nome para testar em uma gestão pública no Espírito Santo. Politicamente é útil para Vidigal e Vidigal é útil para ele. Só que para além disso, existem pautas reais e objetivas. Philipe Lemos terá que provar que não é um turista na Secretaria de Turismo. Ele está em uma área da Serra que sempre foi subdimensionada.
A Serra não é somente uma das cidades mais antigas do Espírito Santo… a Serra é o primeiro aldeamento indígena da Capitania do Espírito Santo e a 13ª cidade mais antiga do Brasil. A história de formação da cidade está intimamente entrelaçada com a fundação do Rio de Janeiro, Niterói e até de São Paulo (se for dar uma esticada). A grandeza da riqueza cultural da Serra é similar à falta de conhecimento geral da população sobre o assunto, que em regra geral, salvo alguns redutos, está em processo de desenvolvimento de identidade em vista da brevidade do fenômeno de expansão urbana que se muito, tem míseros 60 anos.
No esporte a Serra tem potencial para tudo. Aliás, salve nosso Serra FC, que esse ano completa 93 anos e é um dos clubes de futebol mais antigos em operação do Brasil. É muito provável que a essa altura as diversas comunidades esportivas de todos os segmentos possíveis (e são muitas, mesmo) estejam bastante curiosas para conhecer as propostas de Philipe Lemos na área do esporte serrano. No turismo nem se fala… no passado Jacaraípe competia com Guarapari… 23 km de praia, cada uma com características únicas, muitas delas até mesmo de caráter não somente de lazer, mas também histórico, como Nova Almeida, que foi elevada ao status de cidade antes mesmo da Serra conseguir esse feito, quando era somente uma Freguesia de Vitória.
Tem também um tal complexo rochoso de 833 metros de altura, que o jesuíta Brás Lourenço batizou de Mestre Álvaro, em homenagem a um assassino de indígenas, de nome Álvaro da Costa, que era mestre de navio e filho do governador geral. Mas no que pesa essa parte da história, é o patrimônio natural mais vivo no coração do serrano, que lamentavelmente, por incompetência nossa, o pequenino Morro do Moreno ficou mais famoso. E os projetos para integração das comunidades esporte/segurança/social? E para área rural? Até porque, se imaginar uma linha reta cortando o Mestre Álvaro de norte a sul da Serra, toda a face oeste é rural, o que significa 60% do território.
E a crescente demanda por eventos públicos e o boom pós-pandemia de produção de eventos privados, quais propostas, além da manutenção do que já existe e do que já é tradicional (dever de casa)? Até agora falou-se somente de política, na maioria balela (na opinião editorial do Jornal Tempo Novo). Mas e nas questões que objetivamente importam: o setor cultural, esportivo e turístico da Serra? Quais são as ideias? Questões que agora estão a cargo de Philipe Lemos responder.