O ‘tri’ de Ferraço e a democracia

Por Yuri Scardini

É evidente que o Brasil passa por uma crise de liderança, ano após ano os mesmos atores políticos alternando-se na condução da vida em sociedade. Infelizmente nem o ES nem a Serra fogem a esta regra.

Porém há esperança de mudança. Principalmente no poder legislativo, que notoriamente é o celeiro de formação de novas lideranças. Nestas eleições, entende-se que dadas às condições estabelecidas, haverá grande renovação nos quadros políticos da Câmara da Serra. Na Assembleia Legislativa, porém, esta esperança escorre pelos dedos no momento em que fortes movimentações buscam aprovar a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que permite a continuidade no cargo do atual presidente da Casa, Theodorico Ferraço (DEM).

Caso a mudança do texto constitucional venha a ocorrer, Ferraço já poderá pedir música no Fantástico, afinal, será a terceira vez que articulações de bastidores ocasionam em mudanças nas regras internas da Casa de Leis atendendo aos interesses de Ferraço e permitindo-o perpetuar-se no poder. A manobra é impopular nas ruas, mas estimada junto aos deputados. Para tanto, Ferraço finge que não é com ele. É um sintoma triste para os capixabas, pois na esfera de poder mais democrática, se vê uma ditadura velada.

Sobre a relação do ‘tricampeonato’ de Ferraço e o Palácio Anchieta, ainda há uma dubiedade de interpretações, mas o certo é que nada acontecerá sem que de alguma forma haja entendimento entre ambos os lados, e na busca por este ponto pacífico, as eleições municipais de outubro serão a grande moeda troca. Atualmente, quase nada de relevante na política acontece sem que o pano de fundo não seja as eleições para vereador e prefeito. Além disso, a Assembleia Legislativa tem sido palco para a disputa de poder entre Hartung (PMDB) e Casagrande (PSB), vide a trincheira institucional contra o socialista articulado por hartunguista, chamada CPI dos Empenhos.

Cara de ditadura romana

Num cenário mais abrangente de compreensão, há de se considerar também que a política capixaba eventualmente vive uma espécie de ditadura romana, onde na época da República de César, apesar da presença do poder Legislativo na figura dos senadores, o imperador César promovia um verdadeiro desmando normatizado que durante anos impôs uma hegemonia política inabalável.

De qualquer modo, caso a PEC venha a ser protocolada, será necessário três quintos do plenário – 18 deputados – para ser aprovada. E pelas contas dos articuladores pró-Ferraço, o número de adesões já se aproxima do mínimo necessário. Se for aprovada e Ferraço confirmar sua candidatura, ele deve tentar antecipar o pleito – que tradicionalmente é feito em fevereiro – para antes de dezembro deste ano.

Isto porque muitos deputados irão concorrer a prefeituras e, se eleitos, darão vaga a suplentes na Assembleia. Desta forma, com o plantel de deputados que se tem hoje, Ferraço teria mais controle do resultado final.

Essa história toda parece até a Sessão da Tarde. Como num filme reprisado, novamente não veremos a ascendência de novos nomes na condução da política, o que é péssimo para qualquer democracia, que vê na representação política-plebiscitária a forma de expressão mais justa para a população. E dizer que não há outros nomes naquela Casa de Leis capazes de comandar o trabalho legislativo significa diminuir a figura dos outros 29 deputados escolhidos democraticamente pelo povo capixaba.

A política do Espírito Santo permanece na lógica de uma castanheira que em meio ao desmatamento, além de não dar frutos, impede que qualquer outra árvore cresça ao seu redor.