Na noite da última quarta-feira (04), o Jornal Tempo Novo foi surpreendido com a lamentável notícia de que a pesquisa de intenção de votos para prefeito, contratada junto ao Instituto Qualitest, foi impugnada a pedido dos advogados do candidato Pablo Muribeca, em uma ação que o veículo de comunicação considera uma tentativa flagrante de cerceamento.
Essa ação partiu de um candidato que construiu sua narrativa como o “candidato do povo” e o “candidato antissistema”, temas recorrentes durante todo o processo eleitoral. Mas será que Muribeca é realmente o “antissistema” que prega ser?
Neste artigo, fazemos uma juntada de informações públicas e notórias para que o leitor faça suas próprias considerações. Não se sabe até quando este texto ficará online, já que, na Serra, muitas coisas têm sido estranhamente derrubadas, e não seria surpresa se a opinião deste veículo de comunicação, baseada em fatos comprovados, também fosse cerceada.
Quem é Muribeca na política? O deputado entrou na cena política em 2020, quando disputou uma vaga de vereador. Na época, ele era um jovem desconhecido. No entanto, naquele período, Muribeca mantinha um relacionamento amoroso com Viviane Meneguelli, uma das figuras politicamente mais influentes da cidade, atuando como uma espécie de braço forte do então prefeito Audifax Barcelos. Conhecida por sua atuação nos bastidores, Viviane exercia grande influência na cidade, e, com esse respaldo, Pablo se elegeu vereador.
Entre 2021 e 2022, Muribeca se dedicou a criticar a gestão municipal da Serra, especialmente na área da saúde, recorrendo a ações altamente questionáveis, similares às do vereador Gabriel Monteiro, no Rio de Janeiro. Enquanto a Prefeitura da Serra o acusava de invadir unidades de saúde, Pablo argumentava que estava realizando fiscalizações. Esse comportamento lhe rendeu polêmicas e processos judiciais, mas também audiência nas redes sociais, o que impulsionou sua eleição como deputado estadual em 2022, com uma expressiva vitória nas urnas.
Durante seus quase dois anos como deputado estadual, Muribeca cultivou relações profícuas com pessoas muito bem conectadas e poderosas no Espírito Santo. A começar pela escolha partidária, que não foi por acaso. O candidato “antissistema” escolheu o Republicanos, partido que integra o bloco popularmente conhecido no Brasil como ‘Centrão’. Essa sigla deu sustentação política a Jair Bolsonaro durante sua presidência e, atualmente, apoia o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O partido do candidato “antissistema” na Serra tem vinculação nacional com a Igreja Universal do Reino de Deus, liderada por Edir Macedo. Seu presidente é Marcos Pereira, bispo da igreja. No Espírito Santo, o Republicanos é liderado por Erick Musso, ex-deputado estadual e ex-presidente da Assembleia Legislativa, neto de Heraldo Barbosa Musso, que foi prefeito de Aracruz por duas vezes e deputado estadual por três mandatos.
Embora muito bem articulado e relacionado, Erick Musso não possui a mesma desenvoltura popular que Pablo demonstra nas ruas e nas redes sociais para angariar votos. O Republicanos tem um projeto político estadual, e para isso, governar a Serra — que tem o maior eleitorado do Espírito Santo, a maior economia e o segundo maior orçamento municipal — é um fator decisivo para a eleição de 2026. Nesse contexto, Pablo e Erick se aproximaram, já que um complementava as deficiências políticas do outro.
Filiado ao Republicanos, Muribeca não só conquistou o apoio de Erick Musso nos bastidores do poder capixaba, como também foi inserido em um círculo maior de influências, que inclui outros personagens importantes, como o deputado federal Amaro Neto. Amaro, que é jornalista e atua no programa Balanço Geral, exibido pela Rede Vitória de Comunicação, subsidiária do Grupo Buaiz — um dos mais ricos do Espírito Santo —, tem grande votação na Serra. Juntos, Amaro e Pablo, o candidato “antissistema”, formaram uma aliança nas ruas da cidade, pedindo votos aos eleitores.
Assim como com Amaro Neto, Pablo também estabeleceu laços com o deputado federal Messias Donato, que, inclusive, foi quem indicou a vice na chapa de Muribeca — uma pastora da Igreja Quadrangular, denominação com a qual Messias Donato tem boas relações.
Ao expandir sua atuação para fora da Serra e trabalhar em Vitória, Pablo também teve a oportunidade de se aproximar de outro personagem central na atual campanha para prefeito: Marcelo Santos. Deputado em seu sexto mandato consecutivo, Marcelo é uma figura influente nos bastidores políticos, o que não é surpreendente, já que vem de uma família política: ele é filho do ex-deputado federal e ex-prefeito de Cariacica, Aloízio Santos.
Marcelo Santos é, nada mais nada menos, o presidente da Assembleia Legislativa do Espírito Santo, o segundo cargo de maior poder político no estado. Ele tem atuado intensamente nos bastidores da campanha do candidato “antissistema” e, além disso, tem sido visto nas ruas da Serra. Durante seu atual mandato, o presidente da Assembleia não destinou nenhuma emenda parlamentar para a Serra, mas tem demonstrado grande interesse na eleição de Muribeca.
Todo esse arranjo proporcionou ao candidato “antissistema” conexões com o alto escalão dos servidores públicos e dos empresários capixabas. Inclusive, o escritório de advocacia que tem defendido Muribeca é o Cheim Jorge & Abelha Rodrigues Advogados Associados, um dos mais famosos do Espírito Santo.
Na decisão que impediu o Tempo Novo de publicar uma pesquisa de intenção de votos sob multa diária de R$ 100 mil, por exemplo, a pedido da campanha de Muribeca através do referido escritório, um total de seis advogados assinam o processo — um número expressivo para um candidato que se apresenta como “antissistema”.
Na Serra, forças políticas nada antissistema também se aliaram a Muribeca. Quem disputa uma vaga de vereador é Rodrigo Caldeira, que tenta a reeleição e está filiado ao Republicanos, partido de Pablo. Rodrigo já foi presidente da Câmara da Serra, período em que se envolveu em diversas polêmicas, incluindo trocas de acusações com o então prefeito Audifax Barcelos, que chegou a afirmar que a “Câmara estava sob controle do crime organizado” durante a presidência de Caldeira — acusações negadas por Rodrigo. Em 2019, a Serra enfrentou uma grave crise institucional entre a Prefeitura e a Câmara, o que prejudicou o andamento administrativo da cidade.
Outro caso que chama a atenção, envolvendo indiretamente o candidato “antissistema” Pablo Muribeca, é o de um ex-assessor seu que foi preso pela Polícia Civil em julho deste ano. A operação foi conduzida pelo delegado Rodrigo Sandi Mori, da Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) da Serra. Luiz Paulo Santana Braga estava foragido desde maio deste ano, acusado de envolvimento em crimes de tráfico de drogas e formação de quadrilha. O mandado de prisão contra Luiz Paulo foi emitido em 5 de maio, quando ele ainda ocupava o cargo de assessor do deputado. Ele permaneceu foragido até ser preso em julho. Na época, Pablo afirmou que desconhecia o caso.
Esses exemplos são apenas alguns entre muitos que poderiam ser citados; nenhum deles envolve relações ilegais ou irregulares, apenas relações políticas em sua forma mais pura. E é nesse ponto que a realidade e o discurso de Muribeca se chocam. A narrativa de combate contra o “famigerado sistema” conquistou parte do eleitorado, que, de alguma forma, passou a demonizar a política brasileira e viu nos outsiders — ou supostos outsiders — uma solução para combater o “estado das coisas” ou o “poder dominante”.
Entretanto, Pablo não é um outsider. Muito pelo contrário, ele é um político autêntico, plenamente integrado ao universo político em sua forma mais tradicional. Forças externas à Serra, com seus redutos de origem e domicílios eleitorais, enxergaram nele a oportunidade de se aproximar da maior cidade do Espírito Santo em população e economia, oferecendo ao candidato “antissistema” exatamente a estrutura do sistema de poder com a qual estão ligados. Seja através dos mandatos de deputados federais como Amaro Neto e Messias Donato, com suas conexões empresariais e religiosas, ou por meio de figuras como Erick Musso e Marcelo Santos, ex-presidente e atual presidente da Assembleia Legislativa, respectivamente, Muribeca conta com uma sustentação e blindagem que só alguém do próprio sistema poderia ter.