Enquanto a política da Serra está uma verdadeira bagunça, com adiantamento explícito do processo eleitoral na Câmara, na Assembleia Legislativa, no próprio interior da Prefeitura da Serra e sobretudo, nas redes sociais, o PT – partido que governa o Brasil – está quietinho trabalhando as bases partidárias para liderar o movimento de esquerda no município.
Sem nenhum representante na Câmara da Serra, coube aos militantes partidários serranos a movimentação sutil, porém estratégica, sob o olhar atento da deputada Jackeline Rocha, popularmente conhecida como Jack Rocha. Primeira mulher negra eleita deputada federal no Espírito Santo, Jack tem uma longa trajetória de vida entrelaçada com a Serra; no final do ano passado, inclusive ela esteve na sede do Tempo Novo e participou do Serra Podcast. Na ocasião, ela deu sinais de que o partido pensa em ter candidatura própria a prefeito e não eximiu a possibilidade de ser ela, inclusive.
No entanto, nesta fase, a discussão do nome é secundário; de acordo com informações de dentro do PT, a sigla quer reconstruir sua presença no âmago da política serrana, para isso precisa refazer suas bases comunitárias e filiar alguém que esteja presente cotidianamente no debate e na agenda política. Essa pessoa pode ser a vereadora Elcimara Loureiro, atualmente filiada ao PP.
Sinais já vêm sendo dado de ambos os lados; basta ver o evento ocorrido na Câmara da Serra, no último dia 16 de março em comemoração 174 da Insurreição do Queimado, promovido pela vereadora Elcimara, em que nenhum correligionário estadual do PP esteve presente, mas sim uma comitiva petista, como por exemplo, a deputada estadual Iriny Lopes e o secretário da juventude do PT/Serra, Ivo Lopes e representantes do movimento em defesa da população negra da Serra, muitos dos quais ligados ao PT.
Durante outra parte do evento no auditório da Câmara, estiveram o deputado João Coser, a vereadora de Vitória Karla Coser, a ex-vice-prefeita da Serra, Lourencia Riani entre outros petistas. Está certo, que objetivamente falando, historicamente o partido que mais atuou em defesa da valorização do sítio histórico de Queimado e da preservação da significância da Insurreição do Queimado para a luta negra no Espírito Santo, foi o PT, portanto, natural que muitos partidários estivessem presentes. No entanto, não elimina em nada significado político da presença em peso do PT capixaba no evento promovido pela vereadora.
Inclusive, em conversa com a coluna, ela mesma confirmou que existem conversas nesse sentido. E os posicionamentos de Elcimara na Câmara, estão muito alinhados com as narrativas do partido. Recentemente ela aprovou na Câmara da Serra uma Comenda, chamada ‘Marielle Franco’, que será uma honraria destinada a mulheres serranas que tiveram protagonismo na causa feminina, “em especial as mulheres negras”.
Elcimara também foi uma das calorosas vozes contra as palavras ditas pelo vereador Igor Elson, durante a convenção do PL – partido de Bolsonaro – que foram consideradas pelos setores progressistas como homofobias. Para falar a verdade, para quem conhece Elcimara antes mesmo de ser eleita vereadora, ela sempre se reconheceu como uma pessoa de esquerda. Durante a campanha e nos primeiros anos como vereadora, ela deixou o debate ideológico de lado, para se concentrar em questões peremptoriamente locais. Mas a chave virou em 2023; e Elcimara deixou fluir seu ideário também nas suas ações políticas (não que não fizesse antes, mas com muito menos intensidade).
Os sinais estão colocados na mesa e com a confirmação da própria, de que existe conversas canalizadas para filiação no partido de Lula. Novas informações essa semana deram conta que o prefeito Sergio Vidigal, de quem Elcimara tem alinhamento político, pediu a ela que segurasse um pouco. Informações que a coluna não conseguiu confirmar. Outro dificultador seria o diálogo com o PP (que não é ruim) para poder liberá-la sem riscos de perda de mandato. Se acontecer, Elcimara terá a missão de dialogar em especial com o público evangélico da Serra. No que pesa as temáticas assistências e de combate a pobreza abordadas pelo PT, esse público também é muito vulnerável as narrativas de ordem conservadora, pregadas em peso pelos pastores da Serra, dos quais são bolsonaristas em grande e esmagadora maioria.
Impossível não é, basta ver o exemplo da deputada federal do PT carioca, Benedita Silva, que é pastora e líder evangélica (assim como Elcimara, que também é pastora). Acredita-se que a vereadora serrana pode nadar de braçada em vácuo de líderes da esquerda progressista na Serra, até mesmo tomando como exemplo o case de sucesso local da deputada estadual Camila Valadão.
O PT tem feito trabalho sem alarde, mas não deixou de se movimentar… seja com Ivo, Cleber Lanes, Ronaldo Cassundé, dentre outros petistas serranos que querem reerguer o partido na Serra. Curioso é o afastamento das ações na cidade do ex-deputado estadual, Professor Roberto Carlos, que é assessor direto do senador Fabiano Contarato. Verdade é que seja com Jack Rocha, seja concretizando ou não a filiação de Elcimara, seja com o trabalho de base, o partido entende que tem uma “missão” na cidade, que é impedir o avanço da direita bolsonarista.
A Serra está recheada de políticos que se dizem e se identificam de direita, e muitos dos quais são pré-candidatos (declarados ou não) a prefeito da Serra. Veja que sintomático, até mesmo o ex-prefeito Audifax Barcelos, que tem longa caminhada em siglas posicionadas a esquerda, ‘pulou’ de lado na eleição de 2022 ao apoiar Manato para o 2º turno da eleição ao Governo do Estado; e deve manter essa pegada para 2024.
Historicamente o PT sempre utilizou a Serra como moeda de barganha para negociar Vitória, seja com Vidigal, seja com Audifax – com exceção da eleição de 2016, que o partido foi obrigado a lançar candidato próprio (Givaldo Vieira) dado o desgaste da época do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. No entanto, dessa vez, Vidigal e Audifax estou em uma situação considerada vulnerável, além do crescente cansaço do eleitor, existe o fato de que Audifax nem partido tem e a decisão de migrar para a direita fecha todos os canais entre ele e o PT. Já Vidigal até conversa alguma coisa com os petistas, mesmo que bem discretamente, há umas semanas até recebeu eles na Prefeitura da Serra, mas não tem alinhamento orgânico com ninguém do partido e não existe informação sobre nenhuma conversa objetiva.
PT e PSB estão colados no Espírito Santo e no Brasil; isso pode pesar nos rumos que o partido do Lula pode tomar, já que quem governo o Brasil é o Lula e quem governa o Espírito Santo é Renato Casagrande. Mas antes de subir para esse arranjo nacional, o partido da Serra necessita se recompor e ter condições mínimas de sentar a mesa para negociar. Chega até ser anacrônico que o partido que Governa o Brasil tenha uma presença tão tímida na cidade mais populosa do estado. Este é o primeiro desafio que os petistas tentam romper.