A quantidade de pó no ar da Grande Vitória aumentou entre 2018 e 2019. E o pior, o do tipo mais perigoso à saúde, as chamadas partículas finas, que prejudicam o sistema respiratório e são absorvidas pelo organismo. É o que apontam os relatórios de qualidade do ar publicados pelo Instituto Estadual de Meio Ambiente (Iema), cujos dados são obtidos das estações de monitoramento espalhadas pelos quatro maiores municípios da região metropolitana: Serra, Vila Velha, Vitória e Cariacica.
Para as partículas inaláveis, as chamadas PM10, o aumento das máximas médias medidas em 24h se deu em nove estações diferentes, localizadas em Cariacica, Vila Velha e Vitória. O crescimento chegou a quase 200% na Enseada do Suá, bairro da capital.
Mas em duas estações da Serra com dados disponíveis de 2018 e 2019, localizadas em Laranjeiras e Carapina, houve queda na concentração da PM10. Já na estação de Cidade Continental não foi possível a comparação, uma vez que só há dados disponível para este poluente em 2018.
Ainda sobre a PM10, as médias aritméticas anuais também cresceram em cinco das oito estações observadas. Neste quesito, o maior aumento foi também na Enseada do Suá com 35%.
Há de se registrar também que as concentrações do poluente tem ultrapassado o índice máximo recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), chegando ao dobro no caso da Enseada do Suá. Mas, à exceção da estação de Vila Capixaba em Cariacica, para as máximas médias de 24h, ficaram abaixo do que prevê a legislação brasileira, que permite o dobro de poeira no ar recomendada pela OMS.
Partículas menores e ainda mais nocivas
Os relatórios do Iema apontam ainda aumento da presença do pó mais fino entre 2018 e 2019, o chamado PM2,5, também chamado de partículas respiráveis . Este poluente é considerado ainda mais nocivo que o PM10 e a ele são atribuídos problemas de saúde agudos por conta de sua ação direta nas vias respiratórias. Crises de asma, bronquite, sinusite e rinite estão entre esses efeitos, segundo a literatura médica.
Essas partículas também afetam a saúde a longo prazo quando absorvidas pelos alvéolos, entrando no sangue, atingindo pulmões e outros órgãos. A medicina aponta problemas cardiovasculares como consequência.
Para o PM2,5 só há dados disponíveis nos relatórios para as estações de Ibes em Vila Velha e Enseada do Suá. Enquanto na primeira a média das máximas para 24h subiu 6%, na segunda a elevação chegou a 27% entre 2018 e 2019. Já na média anual os índices se mantiveram estáveis nas duas. Mas ficaram perto do limite ou acima do recomendado pela OMS.
Estudo da Ufes publicado em 2015 na Revista de Saúde Pública relacionou aumento de internações de crianças por problemas respiratórios em três hospitais da Grande Vitória ao crescimento de concentrações da PM2,5 nas estações monitoradas pelo Iema.
O estudo avaliou dados de poluição e internações em 2013, sendo assinado pelos pesquisadores Ana Paula Nascimento, do Departamento de Tecnologia Industrial; Jane Mari Santos e Neyval Costa Reis Júnior, do Departamento de Engenharia Ambiental; José Geraldo Mill, do Departamento de Ciências Fisiológicas; Juliana Bottoni de Souza, do Programa de Pós Graduação em Saúde Coletiva. E Valdério Anselmo Reisein, do Departamento de Estatística.
Crescimento da poluição após acordo com Vale e ArcelorMittal Tubarão
O crescimento do material particulado coincidiu com o período após a assinatura do Termo de Compromisso Ambiental (TCA) por Vale e ArcelorMittal Tubarão, empresas que, segundo o Inventário de Fontes Poluidoras publicado pelo Iema, são as maiores responsáveis pela poluição de origem industrial no ar da Grande Vitória. Dentre os poluentes, o famoso pó preto.
O TCA permitiu que em troca da promessa de investirem na redução da poluição, Vale e ArcelorMittal Tubarão recebessem renovação de suas licenças ambientais por parte do Iema. Além do Governo do Estado, subscrevem o acordo os ministérios públicos Estadual e Federal.
Presidente da ong Juntos ES SOS Ambiental, Eraylton Moreschi, considera que não é coincidência o aumento da poluição no ano subsequente à assinatura do TCA. Para ele, o acordo fragilizou o trabalho de fiscalização nas empresas.
“O TCA está sendo indevidamente utilizado como sucedâneo e mitigador dos requisitos de uma licença ambiental. O Ministério Público, o Governo do Estado e as poluidoras estão se arvorando da condição de legisladores e avocando para si atribuições que pertencem a outras autoridades, e mesmo da população, que obrigatoriamente deveria participar em tal espécie de termo de compromisso ambiental”, avalia o ativista.
Eraylton diz também que o aumento expressivo das médias máximas diárias de material particulado nas estações do Iema, pode estar relacionado aos episódios de emissões visíveis no complexo siderúrgico de Tubarão, quando imensas nuvens de poeira puderam ser vistas ora sobre Vale, ora sobre a Arcelor. O ativista mora na Ilha de Boi, em frente às instalações do complexo.
“Fiz diversas denúncias ao Iema com fotos e vídeos dessas emissões. Mas não vejo punição. É inadequado o Iema ser dirigido por um homem que trabalhou trinta anos na Vale, pois há claro conflito de interesses”, critica o ativista, se referindo ao ex-gerente da mineradora, Alaimar Fuiza, que assumiu a presidência do Instituto no início de 2019.
Até o momento da publicação desta matéria, o Iema não havia se manifestado sobre as críticas.
Empresas afirmam que estão investindo para reduzir emissões
Em nota enviada por suas respectivas assessorias de imprensa, Vale e ArcelorMittal afirmam que estão investindo para reduzir a poluição do ar gerada pelo Complexo de Tubarão.
Veja a íntegra do posicionamento da Vale:
A Vale tem investido continuamente para aprimorar seus controles ambientais, conforme compromisso assumido com a sociedade e com os órgãos públicos. A empresa já iniciou a implantação de seu Plano Diretor Ambiental, anunciado em 2018 no valor de R$ 1,27 bilhão, que conta com diversas ações para reduzir ao máximo a emissão de poeira e aprimorar a gestão hídrica na Unidade Tubarão, em Vitória. Dessa forma, até 2023 a Vale reduzirá suas emissões difusas de poeira em até 93% em relação a 2010.
Confira a íntegra do posicionamento da ArceloMittal Tubarão
A ArcelorMittal Tubarão informa que, nos últimos anos, tem feito expressivos e sucessivos investimentos na área ambiental. Dentre as diversas ações, tem destaque a instalação, em 2018, do Gas Cleaning Bag Filter, e de dois novos carros de carregamento na Coqueria, entre outros.
A empresa também tem cumprido todas as ações acordadas junto ao Governo e aos Ministérios Públicos Estadual e Federal, quando da assinatura do Termo de Compromisso Ambiental (TCA), em 2018. Dentre as ações já executadas estão a implementação de novos lava-rodas para evitar arraste e emissão de material particulado (18 estão em operação, sendo 12 novos); a aplicação de polímeros nas pilhas de materiais; a reforma do Sistema de Despoeiramento da planta de reciclagem de Coprodutos; o enclausuramento de trechos de correias transportadoras; e maior visibilidade dos indicadores de desempenho dos equipamentos de controle ambiental.
Outros investimentos em andamento incluem o enclausuramento de Torres de Transferências e Prédios; a pavimentação e drenagem de vias e pátios; o avanço na instalação de equipamentos de controle nas Correias Transportadoras; a otimização, visando redução dos pátios de materiais; e o novo despoeiramento no Pátio de Beneficiamento de Coprodutos.
Além das ações previstas no TCA, a empresa tem se empenhado em evoluir para um novo patamar em gestão ambiental e mapeou outras iniciativas de aprimoramento que estão sendo executadas voluntariamente, dentro do seu Programa Evoluir.
Todas essas informações podem ser acessadas, na íntegra, no APP Evoluir ArcelorMittal, aplicativo criado pela empresa para permitir à sociedade acompanhar tudo o que está sendo feito em relação ao TCA. A ferramenta está disponível para download na loja Google Play e na App Store.