Sempre é bastante delicado falar sobre direito de família, envolve muitos sentimentos conflitantes e, quase sempre, traumas que perduram por toda a vida. O desejo de abandonar o sobrenome do pai, retirando-o do próprio nome civil, é um desses casos.
Recentemente, a 3ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), autorizou que uma pessoa retirasse o sobrenome paterno em função do abandono afetivo e material sofrido.
O abandono afetivo se caracteriza por uma omissão de cuidado, de criação, de educação, de companhia e de assistência moral, psíquica e social que o pai e a mãe devem ao filho quando criança ou adolescente.
O abandono material, previsto no art. 244 do Código Penal, consiste na recusa injustificada do infrator de prover materialmente com o necessário para a subsistência da vítima; pagar pensão alimentícia; ou deixar de socorrer ascendente ou descendente sem justa causa. A vítima pode ser cônjuge; ascendente inválido ou maior de sessenta anos; filho menor de dezoito anos ou inapto para o trabalho. Entende-se por subsistência a alimentação, vestuário, remédios, educação, habitação etc.
A ação de retificação de registro civil foi ajuizada no sentido de que o sobrenome do pai trazia constrangimento e sofrimento a autora, afrontando os direitos constitucionais à dignidade e personalidade.
O relator, Desembargador Donegá Morandini, entendeu que houve realmente o rompimento do vínculo afetivo entre o genitor e a filha, e que mesmo sendo delicado o rompimento da linha genealógica paterna, as circunstâncias vivenciadas pela autora da ação gerou intenso sofrimento e desgosto.
Assim, de forma excepcional, acolheu o pedido autoral a fim de garantir proteção da própria personalidade da filha, entendendo que o princípio da imutabilidade do nome não é absoluto. Tal é, inclusive, o posicionamento assentado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Importante destacar que tal ação não é simples, requerendo todo um arcabouço probatório que deixe claro e evidente o abandono efetivo e material.