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Secular família Duarte volta com força para ‘as cabeças’ da política da Serra

Edílson Duarte é um dos principais expoentes da família Duarte. Foto: Arquivo Jornal Tempo Novo, 1984.

A política é, de fato, uma invenção humana surpreendente. Há poucos meses, a família Duarte lutava pela sobrevivência na política da Serra, e em menos de dois meses, conseguiu consolidar uma vitória expressiva: encerram 2024 com Andréa Duarte eleita vereadora e Fábio Duarte assumindo um mandato como deputado estadual. Com esse desfecho, a família fecha o ano com chave de ouro e um futuro promissor pela frente.

Eleita com 3.795 votos, Andréa Duarte (PP) será diplomada vereadora da Serra no próximo dia 18. Já seu esposo, o ex-vereador Fábio Duarte (Rede), retorna ao cenário político, agora como deputado estadual. Contudo, um outro nome da família também merece destaque: Edílson Duarte, considerado o patriarca do grupo familiar, que segue influente nos bastidores.

Uma família de raízes profundas na Serra

A história da família Duarte está profundamente ligada à formação da Serra. São parte de uma linhagem que ocupa funções públicas desde os primórdios da organização administrativa do município. Entre seus antepassados mais icônicos está o Padre Joaquim de Santa Maria Magdalena Duarte, que foi vereador na primeira legislatura da Câmara da Serra, entre 1833 e 1836. Joaquim também exerceu o cargo de deputado provincial do Espírito Santo em diversas legislaturas e chegou à presidência da Assembleia Legislativa nos anos de 1858 e 1859.

Outro nome de destaque é o Padre Marcellino Pinto Ribeiro Duarte, também serrano, que foi deputado provincial do Espírito Santo em 1837 e 1838. Marcellino tornou-se uma figura de relevância nacional, sendo amigo pessoal de José Bonifácio de Andrada e Silva, o “Patriarca da Independência do Brasil”. Marcellino, inclusive, celebrou a missa de falecimento de José Bonifácio, o que reforça sua importância histórica.  

Para não estender muito, outro exemplo relevante é a ancestralidade da família Duarte com o primeiro presidente da Câmara da Serra, Luiz da Rosa Loureiro. Em 1833, o chefe do Legislativo acumulava também as funções do Executivo, já que o cargo de prefeito ainda não havia sido criado. Luiz da Rosa Loureiro, nascido na Serra em 1779, é uma figura histórica importante. Além de ‘primeiro prefeito da Serra’, ele foi avô do primeiro governador do Espírito Santo, Afonso Cláudio de Freitas Rosa, e é pentavô do atual patriarca da família Duarte, Edílson Duarte. Por isso, quando tratamos dos Duarte, estamos falando de uma linhagem política que ajudou a construir a Serra enquanto uma cidade independente. 

Edílson Duarte e Bairro Pitanga

A atual ramificação da família Duarte tem suas raízes em Pitanga, um dos bairros mais antigos da Serra, que já existia muito antes da “nova Serra” surgida com o processo de industrialização iniciado na década de 1960, com a implantação do Porto de Tubarão. Diversos membros dessa linhagem participaram ativamente da vida pública do município, com destaque para Edílson Duarte que na década de 1970 liderou o enfrentamento contra as pedreiras que explodiam as bases do Mestre Álvaro e geravam enorme incômodo no bairro.

Ex-morador de Pitanga, Edílson Duarte assumiu uma vaga na Câmara Municipal da Serra durante a legislatura de 1971-1973, quando o prefeito era Erix Guimarães (então da antiga ARENA). Posteriormente, Edílson se destacou como presidente da Câmara na legislatura de 1977, primeiro período do governo de José Maria Miguel Feu Rosa. Ele também exerceu mandato como vereador na gestão de João Batista da Motta (1983-1988).

Na segunda gestão de Feu Rosa, em 1989, Edílson ocupou o cargo de secretário de Finanças. Após o assassinato de Feu Rosa, Edílson se afastou da cena política para focar em seus negócios, entre os quais o Cemitério Jardim da Paz, que havia fundado anos antes, tornando-se nas décadas seguintes um dos empresários de maior sucesso do Espírito Santo. Ele então passou o bastão político para seu irmão, Ericsson Duarte, que manteve a tradição familiar ao ocupar mandatos na Câmara Municipal da Serra por mais de 30 anos, entre outros parentes (que em alguns momentos chegaram até a entrar em rota de colisão).

Fábio Duarte

Eis que surge Fábio Duarte, sobrinho de Edílson Duarte, que começou a se envolver na política ao prestar apoio aos mandatos de Sérgio Vidigal na primeira década dos anos 2000. Fábio disputou a vaga de vereador duas vezes, sendo eleito pelo PDT para a legislatura de 2017 a 2020. Apesar de eleito pelo PDT, Fábio optou por adotar uma postura alinhada ao então prefeito Audifax Barcelos, não integrando a oposição.

A legislatura de 2017 a 2020 foi marcada por uma grave crise institucional na Câmara da Serra, que teve Rodrigo Caldeira na presidência em meio a frequentes confrontos com Audifax. O ambiente era de forte hostilidade, e Fábio desempenhou um papel importante na contenção das movimentações oposicionistas que buscavam destituir Audifax da Prefeitura.

Fábio foi um dos vereadores que publicamente denunciaram a articulação da oposição, ajudando a desarticular o movimento e a apaziguar a crise institucional que marcou o município entre 2019 e 2020. Nesse processo, a família Duarte estreitou laços com Audifax, com Edílson atuando como uma espécie de conselheiro para o então prefeito. Na escolha de um nome para a sucessão em 2020, Fábio Duarte emergiu na reta final como o “abençoado” de Audifax, que o apoiou abertamente. Embora já houvesse, à época, um certo desgaste com o revezamento político entre Audifax e Vidigal, o sentimento de renovação ainda não estava suficientemente amadurecido, o que levou à vitória de Vidigal, reconduzido a um quarto mandato após derrotar Fábio no segundo turno.

Mesmo com o resultado adverso, a família Duarte permaneceu aliada de Audifax. Sob a liderança de Edílson, Fábio lançou sua candidatura a deputado estadual em 2022. Ele teve um bom desempenho, acumulando 13.792 votos, mas o número foi insuficiente para garantir a vitória.

Ainda assim, a família Duarte se manteve atenta às movimentações políticas e regras eleitorais, trabalhando em silêncio e de forma estratégica, com a percepção de que novas oportunidades poderiam surgir. Esse foco explica porque Fábio não mudou de partido, mesmo quando o próprio Audifax deixou a Rede Sustentabilidade.

Renovação

Entendendo o forte sentimento de renovação para as eleições de 2024, Edílson Duarte conduziu cuidadosamente o processo de transição dentro da família para evitar atritos. Seu irmão, o vereador Ericsson Duarte, abriu mão de disputar a reeleição, direcionando os esforços familiares para Andréa Duarte, esposa de Fábio Duarte, que já havia demonstrado um interessante traquejo político em pleitos anteriores.

Com a decisão pacificada de que Andréa seria a candidata, ela chegou a ser sondada por aliados do então pré-candidato Weverson Meireles (PDT) para compor a chapa como vice. O plano do PDT era que Audifax Barcelos desistisse da candidatura e indicasse Andréa como vice, trazendo a família Duarte para o jogo político de forma estratégica. No entanto, as negociações não prosperaram, pois Audifax decidiu manter sua candidatura. Andréa, então, disputou uma vaga na Câmara Municipal e foi eleita com uma votação expressiva.

No segundo turno, Edílson, Ericsson, Fábio, Andréa e diversos outros familiares uniram forças ao projeto liderado por Weverson Meireles, indo às ruas contra Pablo Muribeca e apoiando o indicado de Sérgio Vidigal.

Até aquele momento, a eleição de Andréa representava uma espécie de sobrevida política para uma das famílias mais tradicionais da história da Serra. Porém, o grupo sabia que 2024 poderia reservar um desfecho ainda mais positivo. Atentos, os Duarte acompanharam de perto as investigações contra o Partido da Mulher Brasileira (PMB), que indicavam fraude na cota de gênero. Após refazerem as contas diversas vezes, concluíram que, caso os pouco mais de 9 mil votos do PMB fossem anulados, o recálculo eleitoral daria a Fábio Duarte um mandato-tampão de dois anos na Assembleia Legislativa.

E foi exatamente o que aconteceu. Nesta semana, o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) recalculou o coeficiente eleitoral, desconsiderando os votos do PMB, o que garantiu a vitória de Fábio. Em questão de meses, a família Duarte saiu de um cenário de sobrevivência política para um protagonismo renovado: com mandatos na Câmara da Serra e na Assembleia Legislativa, além de um forte relacionamento com as elites empresariais do Espírito Santo.

A cereja do bolo veio na forma da aliança com o novo prefeito, Weverson Meireles, que declarou que a vitória de Fábio “é a vitória da Serra”. Assim, caros leitores, escreve-se mais um capítulo fascinante na literatura política recente da Serra, em que a secular família Duarte não apenas se mantém no jogo, mas continua “nas cabeças” – como já faz há 200 anos.

Yuri Scardini

Morador da Serra, Yuri Scardini é repórter do Tempo Novo. Atualmente, o jornalista escreve para diversas editorias do portal, principalmente para a editoria de política.

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