ANA BOTTALLO
Comparado com o fim da última década (2009), o sentimento de sofrimento global passou de 25% para 31% em 2021 em todo o mundo.
As pessoas estão mais estressadas, tristes e preocupadas, de acordo com uma pesquisa global.
Somente em 2020, no primeiro ano da pandemia, o aumento foi de 2,5 pontos percentuais.
Os dados foram publicados em um artigo nesta segunda (27) na revista científica PNAS (Proceedings of the National Academy of Sciences), ligada à Academia Nacional de Ciências americana.
O estudo, conduzido por Michael Daly, da Universidade de Maynooth (Irlanda), e Lucía Macchia, da Universidade Cidade de Londres (Reino Unido), buscou identificar as tendências globais de sentimentos de aflição e estresse, que podem estar ligados a uma piora na saúde mental.
De acordo com os pesquisadores, dados regionais de aumento dos sentimentos de tristeza e estresse nos Estados Unidos e Reino Unido já eram conhecidos desde a década de 1990, mas pouco se sabia sobre a tendência global.
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Os cientistas então utilizaram os dados de uma plataforma chamada Gallup (Bases de Dados Globais para Uso Público, em inglês) com informações de mais de 1,53 milhão de adultos de 113 países, incluindo o Brasil, de 2009 a 2021. O questionário continha dados sociodemográficos, como idade, sexo, renda mensal e escolaridade, e perguntas sobre sentimentos de estresse e tristeza -“Você experimentou os seguintes sentimentos por uma parcela significativa no dia anterior?”- com respostas sim e não.
Cada resposta era codificada (zero para não e um para sim) e, com base nos dados, foram quantificadas em porcentagens para analisar o aumento da sensação de sofrimento.
A análise de sensação de sofrimento levou em consideração as sensações pessoais e, assim, não pode ser utilizada para avaliar a prevalência populacional de ansiedade e depressão, afirmam os autores. No entanto, é possível que esse quadro tenha piorado após a pandemia, especialmente nos mais jovens.
Segundo o estudo, globalmente os sentimentos de tristeza e estresse aumentaram em todas as categorias e grupos etários, mas ele foi maior em pessoas com até o ensino fundamental completo (aumento de 9,53%) e com a menor renda familiar (aumento de 7,27%).
As mulheres (6,75%) e pessoas mais jovens, com 35 anos ou menos (6,87%), também tiveram o maior aumento de sensação de estresse e tristeza na última década.
Quando considerados os três sentimentos independentes, os de estresse (9,97%), tristeza (6,31%) e preocupação (6,22%) registraram aumento significativo de 2009 a 2021, enquanto ódio não teve uma subida estatisticamente significativa no mesmo período.
Já considerando o aumento de 2020 para 2021, a pandemia piorou os sentimentos de tristeza e estresse em todos os grupos exceto nos adultos com 55 anos ou mais e naqueles indivíduos com a escolaridade e renda mensal mais baixas. Embora seja um aumento significativo, os pesquisadores afirmam que esse aumento a curto prazo ainda precisa de maior monitoramento para confirmar se será superior ao observado em anos pré-pandêmicos.
Para Michael Daly, professor associado do Departamento de Psicologia da Universidade de Maynooth, o aumento da sensação de tristeza e estresse nos jovens com 35 anos ou menos demonstra uma série de fatores aos quais eles são expostos diariamente, a começar pelas pressões frente ao mundo pós-crise.
“Algumas explicações possíveis no período analisado incluem o período após a crise econômica global de 2008, em que as incertezas econômicas relacionadas à segurança no trabalho e às dívidas contraídas foram vivenciadas por muitas pessoas, mas tiveram um impacto particular nos adultos e grupos menos poderosos.”
Neste sentido, a pandemia da Covid também teve um efeito maior na saúde mental dos jovens, como também foi evidenciado em estudos feitos no Brasil.
De acordo com a OMS (Organização Mundial da Saúde), houve um aumento de 25% da prevalência global de ansiedade e depressão no primeiro ano da pandemia, e os dados da última pesquisa Vigitel (Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por inquérito Telefônico) de 2021 apontam que 13,5% da população brasileira teve diagnóstico de depressão. São os jovens e as mulheres que mais sofrem com exaustão e preocupação constante no trabalho, segundo um estudo desenvolvido pela UFRJ.
“A disrupção social foi maior para adultos jovens, que tendem a desenvolver relações sociais maiores e mais diferenciadas em vez de manter um mesmo grupo com quem se relaciona com frequência. As experiências podem, inclusive, se sobrepor a sentimentos de depressão e ansiedade (e também de tristeza e preocupação) e geram uma preocupação de aumento desses sintomas, levando a aumento de diagnósticos”, afirma o pesquisador.
“Também há a possibilidade de que uma maior conscientização e aceitação dos problemas mentais e emocionais possam explicar o aumento (do sofrimento) nos mais jovens, embora isso não explicaria a subida também nos grupos menos escolarizados”, diz Daly.
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