Foi no km 101,2 da BR-101 que o então vereador Cabo Porto, de 44 anos morreu. Além dele, a esposa Thatianne Gonçalves Vasconcelos, de 24, e o filho João Vasconcelos Porto, de apenas 4 anos, também seriam vítimas desse lamentável ocorrido. Hoje – 22 de fevereiro de 2021 – a tragédia completa 1 ano.
Era carnaval de 2020… já se falava sobre uma doença causada por um novo vírus identificado na China – ainda muito desconhecido. A Organização Mundial da Saúde viria a decretar pandemia apenas 20 dias depois da morte de Porto. No Espírito Santo, o primeiro caso confirmado de coronavírus ocorreu somente na quarta-feira de cinzas – dia 26, mas que viria a ser divulgada no dia 5 de março.
O primeiro óbito, um morador da Serra, ocorreu na quinta-feira, 02 de março. A missa de sétimo dia da morte da família Porto já completava dois dias. Porto morreu sem saber do desafio que o mundo estava prestes a passar.
Mas naquele momento, o único desafio objetivo e de curto prazo que Porto tinha, era enfrentar os 561 km para conduzir sua família até Porto Seguro, cidade da qual o vereador iria passar o carnaval ao lado da irmã e cunhado de Thatianne. Mas para lamento de centenas de milhares de pessoas, Porto, infelizmente não chegaria sequer a Bahia.
Foi próximo do meio dia, na entrada de Jaguaré, logo na saída do trecho que compreende a reserva biológica de Sooretama. Local que é marcado por retas – no entanto com grandes ondulações que atrapalham a visão a frente do motorista.
Assessores próximos a Porto contam que quando policial, ele era tido como um dos melhores motoristas da corporação. De acordo com eles, durante as perseguições a bandidos, ele era o responsável pela direção da viatura. O que faz com que o acidente seja ainda mais inconforme.
Na saída da reserva biológica, de acordo com testemunhas, Porto jogou o carro – um HB20 sedan, cor cinza com vidros escuros – para a esquerda e foi ultrapassando os demais veículos. Foi quando o vereador entrou no caminho de Adenilton Belmonte, que vinha de Pernambuco e seguia até o Rio de Janeiro dirigindo seu caminhão carregado de sucata.
Segundo a Polícia Rodoviária Federal, a colisão foi frontal e vitimou Porto e família na mesma hora. Adenilton disse a Polícia que estava a 80km/h e no momento em que avistou Porto, tentou frear, mas a colisão era irreversível.
Assessores de Porto ainda buscam entender o que de fato aconteceu para um motorista tão experiente como ele perder a vida de forma tão trágica. Inclusive existem algumas teorias, mas a única coisa efetivamente comprovada é a saudade que Porto, Thatianne e João deixaram em seus familiares, amigos e assessores.
O acidente chocou muita gente e trouxe milhares de pessoas para o cemitério em pleno carnaval. A despedida foi marcada por muito choro e tristeza; e autoridades de todo o estado estiveram presentes para dar o último adeus a Porto e sua família.
Vida de Cabo Porto
Cabo Porto estava em seu 1º mandato de vereador. Foram 3.080 votos dentro da urna em 2016. Foi uma das ‘surpresas’ daquele pleito. Porto era do tipo que ‘chega chegando’… Começou o mandato de forma intensa, tinha coragem para trazer pautas polêmicas – curiosamente ele odiava esse termo.
Era brigão, brincalhão e de opinião. O vereador adorava exibir sua arma nas redes sociais, uma pistola .40, o que eventualmente lhe gerava desconforto com partidários do PSB que condenavam este tipo de conteúdo. Mas Porto dizia que iria tocar o mandato do jeito dele e se referia a ‘bandidagem’ como ‘ratos’.
Em uma extensa entrevista que o TEMPO NOVO publicou com Porto, 4 meses antes de sua morte, o vereador defendia que apesar de toda a dificuldade, todos tinham uma opção a fazer. E ele mesmo era fruto de suas opções: ser policial militar.
Infância conturbada em Castelândia, marcada por dificuldades financeiras, Porto teve que trabalhar desde cedo. Acompanhou de perto a situação de violência doméstica que sua mãe vivia com o então padrasto, ‘adultero, alcoólatra e violento fisicamente’. Porto então foi para a rua, não para ‘vadiar’, mas para trabalhar. Começou vendendo salgadinho e aos 13 anos passou a ser sorveteiro na praia de Jacaraípe.
Em 1996, aos 17 anos, ele realizou seu sonho: entrou para PM. Como policial, Porto recebeu 400 menções honrosas e 50 prêmios pela atuação operacional. Em entrevista, Porto disse que já matou bandidos durante ações policiais, mas que não se orgulhava disso, pois ‘quando um policial precisa matar para proteger alguém, é porque a sociedade falhou’.
Na política, Cabo Porto era tido como ‘um dos caras’ que iriam crescer. Em 2018, Porto chegou a ser cotado para ser candidato a deputado estadual, mas o partido conseguiu segurar. Já naquele momento é bem provável que ele faria um ‘arraso’ nas urnas.
Depois de 2018, Porto seguiu sua vida de vereador e com a aproximação de 2020 vinha sendo assediado por muitos partidos e lideranças políticas. Ele inclusive estava cotado para ser candidato a prefeito, fato que sempre o assustou. Em uma conversa poucos dias da fatalidade, ‘em off’ ele dizia: ‘E se eu perder a eleição? Preciso sustentar minha família e a remuneração de um cabo da reserva é baixa’.
Na prática, Porto estava em uma situação confortável para ser reeleito vereador e a tendência é que isso ocorresse, sendo inclusive um dos mais votados. Ele sonhava com a tribuna da Assembleia Legislativa, pois uma vez lá, ele teria condição de legislar sobre a Polícia Militar, que era sua paixão de vida pessoal. Infelizmente, o acidente interrompeu todos esses planos e hoje o que há é a memória de um amigo, de um policial trabalhador e um vereador corajoso.
Porto deixou um filho mais velho, que agora tem 18 anos, mas também deixou seus assessores órfãos de um líder em comum. Muitos deles, habilidosos assessores, se relocaram na arte de fazer política, mas o espólio do Porto ficou fragmentado. Seu nome foi eternizado na antiga Arena Riviera, agora recém-inaugurada, mas ainda com pouco uso devido à pandemia do coronavírus.